o dodô, que não é o meu amigo haroldo

resgatei quase na boca do lixo as provas de um livro muito bacana, o canto do dodô, de david quammen (companhia das letras).
imagino que esse livro não deva ter tido grande sorte, no máximo uma sinopse.
ninguém sabe se o pássaro dodô cantava – um viajante que foi à ilha Maurício em 1638 contou que ele grasnava como um filhote de ganso (a última vez que um dodô foi avistado foi em 1662, por um náufrago holandês que chegou à ilha depois de seu navio ir a pique numa tempestade)
quammen defende que a extinção do pássaro dodô é representativa da modernidade.
a maioria das espécies hoje extintas viveram em ilhas – desde 1600, 171 espécie e subespécies de aves tornaram-se sabidamente extintas. desse total, 155 viviam em ilhas, o que dá mais de 90%.
se se considerar o fato de que apenas 20% das aves conhecidas vivem em ilhas, dá para ter uma idéia do tamanho da barbaridade.
o bicho numa ilha é presa fácil.
os homens em ilhas são presas fáceis.
o pássaro dodô sumiu e virou lenda. mas quem é que quer virar lenda?
um holandês chamado van neck publicou um relato, em 1601, que descrevia o pássaro.
“nós as chamávamos de walckvögel, que quer dizer pássaro repulsivo em holandês”. será que tem alguma relação com o nome da apresentadora?
o bicho tinha carne dura e rija, que só “estômagos sebentos” poderiam apreciar, relata van neck.
o mapeamento do surgimento e desaparecimento do pássaro dodô é um mero pretexto para quammen falar da própria natureza humana. ele mesmo como um cientista iniciante caçando formigas é algo de morrer de rir. lembra os momentos mais mal humorados de malinovski.
“minha tarefa em angel de la guarda, a incumbência ridícula reservada a um novato, é fazer um levantamento da variedade e abundância de formigas”, ele conta. “claro, terei o máximo prazer, respondi, sem antever o tédio de tentar coletar formigas numa ilha tão ressequida quanto esta”.
seu estilo é envolvente, sedutor. vejam como ele descreve uma de suas fontes:
“carl jones é um galês alto e sarcástico, com um fraco por piadas infames e uma dedicação quase maníaca à vida silvestre de maurício. sua reputação se estende muito além do sudoeste de Maurício, mas eu acabo de conhecê-lo e não sei o que esperar”.
quammen menciona vários cientistas e estudos, incluindo o trabalho de barbara zimmerman sobre as rãs da amazônia (há também um capítulo sobre o ouriço da amazônia).

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Jotabê Medeiros, paraibano de Sumé, é repórter de jornalismo cultural desde 1986 e escritor, autor de Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano (Todavia, 2017), Raul Seixas - Não diga que a canção está perdida (Todavia, 2019) e Roberto Carlos - Por isso essa voz tamanha (Todavia, 2021)

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