Há uma semana, Caetano Veloso me achincalha em seu blog por conta de crítica desfavorável que escrevi sobre seu show com Roberto Carlos, semana passada, no Auditório do Ibirapuera.
Certamente crê que, no ataque, conseguirá neutralizar a impressão negativa que a crítica tenha produzido. “A picuinha me redimirá”, deve pensar o perspicaz cantor e estadista. Caetano tem apenas 66 anos, mas demonstra sinais de senilidade precoce.
Começou intempestivamente, me xingando. Primeiro, achei que seu destempero o tornava um tanto frágil e patético, e relevei. É uma dupla armadilha esse tipo de coisa: se respondo a barbaridade dessa natureza, vão dizer que quero polarizar com a vaca sagrada da MPB (e tenho alergia a publicidade); se não respondo, ele acaba sedimentando sua verdade particular, que é fazer pensar que estou admitindo que vi o que não vi.
Ontem, Caetano voltou à carga. Agora, veio vestido com as armas de Guardião da Gramática. Aprendeu até a colocar trema corretamente em “qüinqüênio” – um progresso considerável para quem grafava “trexo” em vez de trecho, que escreve “veses” no lugar de vezes, e acha que “hilário” é o mesmo que “hilariante” (quando o primeiro é um nome próprio, e o segundo um adjetivo), e que confunde Pasquale Cipro Neto com um certo “Pascoali”. Vejam: não estou colocando em suspeição a origem de seu manifesto gramatical, apenas achando engraçado.
Instalado em sua cadeira na Escolinha do Professor Caetano Raimundo, ele explica que tenta exibir sua faceta de mestre das “gramatiquices” para a ex-mulher empresária. Diz que um termo que cunhei, naftalínico, é um neologismo incorreto. Prefere “naftalênico”, porque naftalina é marca, e sua origem está no naftaleno, etc e tal. Imagino Caetano, travestido de scholar, aconselhando os Paralamas a mudar o nome de Loirinha Bombril para “Loirinha lã de aço”, argumentando que Bombril é o nome comercial da coisa.
Confesso que achei muita graça no seu tom de corretor de provas do Enem: “Na segunda frase temos logo uma formulação torta: ‘é um efeito sintomático’. Mas isso é problema de estilo.”
Bom, se Caetano Veloso aponta um problema de estilo no meu texto, devo curvar-me. É um artista que está em seu auge criativo, que produz uma poesia tão fascinante quanto os versos adiante: “Falta o mundo ver assim/ Água de Kassin lava a Nova Capela/ Eu amo PUC e a gíria dos bandidos/ Fundição Progresso/ Eis a Lapa/ Lula e FH/ Amo nosso tempo/ Em ti”. Uau! Logo se vê que estilo não tem lhe faltado em sua produção recente: “Não tenho inveja da menstruação, não tenho inveja da adiposidade, só tenho inveja dos orgasmos múltiplos”
E prossegue o nosso vigilante da língua: “Já as vírgulas que separam a expressão ‘ao vivo’ são mais do que desnecessárias: constituem erro, uma vez que “ao vivo” tem o mesmo papel de adjetivar ‘homenagem’ que ‘vítrea’ tem de qualificar ‘imagem’. Trata-se de uma mania de usar vírgulas em excesso, coisa que tem prejudicado tantos textos jornalísticos (e mesmo literários) entre nós. Há também imprecisão (e mau gosto estilístico) em chamar ‘a memória’ de ‘imagem vítrea’ (por quê? porque se tratava de projeção de vídeo? será que alguém pensa que vídeo é vidro? ou apenas quer dizer que imagens na memória são de vidro?).”
Caetano está enganado, como enganado está o seu professor de português (ou o antropólogo “ixperrto” de plantão que copidescou isso para ele). Vítrea, se ele tivesse se dado ao trabalho de ir a outra fonte, talvez o professor Houaiss, significa também “translúcida”, e é nessa acepção que é empregada aqui. Nem toda imagem é translúcida. Aquela era.
Caetano me perdoe pela franqueza, mas eu trocaria todas minhas vírgulas por um bom show naquela noite, e acho que teria feito um bom negócio. Mas as vírgulas estão no meu texto, e infelizmente ele vai ter de engoli-las.
CONTINUA…
Caetano poderia ser mais humilde. Não sei, mas ele parece que gosta de polemizar para se fazer lembrado. Sempre coloca-se em um altar, ou patamar, como um mártir. Também parece ter à sua disposição toda uma estrutura publicitária para promove-lo como uma grande liderança pós golpe militar. A globo em “Anos Rebeldes” ajudou a juventude crer nesse mito. Ele não representou nada parecido ou similar a Vandré e Chico Buarque . Ressalto, apesar do esforço empreendido por Caetano junto à mídia, que ele não foi nada em termos políticos e sequer merecia ter sido preso no tempo da ditadura e remetido a um exilio com direito a show, em Salvador, para arrecadar fundos. Isto com a promoção via Rádio, em programa de França Teixeira. Depois, recordo, a TROPICÁLIA dele durou 1 ano. O Torquato Neto é quase esquecido de modo injusto e desrespeitoso. No mais a tropicália foi um movimento que :”foi sem nunca ter sido”. Caetano foi influenciado pelo movimento hippie e pelo psicodelismo lisergico de então. Na Bahia ele não era bem visto pelas esquerdas. Foi vaiado em um festival e, achando-se acima de eudo e de todos, deu vivas a Clarice Lispector e vaticinou que DEUS estaria solto, naquela época tão endemoniada!!! O grito dele foi um desabafo abusado de quem não aceita crítica, ou que está acima de tudo. Não agradou e devia compreender o fato, mas foi inconformadamente agressivo e colérico. Produziu alguma coisa ao gosto popular e de intelectuais, mas é imperativo que os mais velhos, que viveram os anos pós 64, revelem aos mais jovens a verdade: Caetano não era o que a juventude atual imagina ter sido e a TROPICÁLIA não passava de um psicodelismo cheio de esquisitices. A única coisa que resultou da tropicalia foi a palavra DESBUNDE e o fato de sereem os tropicalista um bando de desbundados e outras coisas mais que não vale à pena recordar. Sei que ele passou maus momentos quando foi preso; uma prisão que nada tinha a ver com ideologia, mas com a “estampa” multicolorida importada de HAIR. Não sei a razão dos “tietes” dele imaginarem outras coisas a respeito do mito Caetano midiatico. Mercê de toda singeleza, é tão totalitario e absolutista quanto o regime militar que, pacificamente, emprestou a régua e o compasso para que eles, após um meteorico show no TCA, angariassem verba antes do chamado exilio em Londres. Eles (Gil e Caetano) até tinham programa de TV que promovia algo que achavamos muito chato e mudavamos de canal. Era chaterrimo assisti-los e olhe que eu até gosto de muitas músicas que ele canta e cujas letras pertencem a outras pessoas. Tem uma voz bonita, mas quando solta o verbo não passa de um “destrambelhado”. Hoje ele nega o passado e diz que nunca foi amigo de “Maria Joana”. Vale recordar o episódio da prisão de Gil para saber o que ele fez com a descarga do sanitário do quarto que o alojava. Pena que tanta gente boa não diga isso a ele. Outra coisa que Caetano precisa acabar: o velho ressentimento contra as “esquerdas”, além de sublimar aquelas vaias recebidas em pleno Festival. Não foi um ícone de coisa alguma. Geraldo Vandre e o grande Chico Buarque, sim. Pena que a nossa juventude não tenha vivido o tempo do “movimento tropicalista” que “foi, sem nunca ter sido”. Perdoe-me Tom Zé e Capinam. Aquele abraço respeitoso a todos, inclusive ao Caetano, mas justiça se faça.
M Drummond
Essa saiu na sexta-feira na seção de cultura do “jornal modelo” NYT: “Machado 21, a citywide celebration of the centenary of the Argentine novelist Machado de Assis”.
Jotabê: confira esse post no meu blog:
http://penetralia-penetralia.blogspot.com/2008/09/noves-fora-insulto-e-preconceito.html
E também meu comentário ao texto sobre os linguistas: Ai que preguiça!
Abraços do Lúcio Jr.