uma pausa de mil compassos

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tá, já sei de cor todas as besteiras e gafes cometidas pelo lula ontem em porto alegre, no fórum social mundial. mas posso virar o disco só um pouquinho, falar sobre umas outras coisinhas que ele disse entre uma gafe e outra?

“alguns companheiros que nunca tiveram problema na vida e já têm sua vida garantida nas boas universidades públicas federais são contra essas bolsas porque na verdade eles são contra pobre estudar, contra que pobre tenha acesso à universidade.” nossa, isso é o óbvio ululante, mas antes de lula nenhum outro presidente falou o óbvio ululante, né?

[é óbvio e está disseminado em toda a sociedade brasileira – é só notar o exemplo atual no mundo da moda, com essa grita geral de asco porque o “povo” tá conseguindo entrar nos desfiles. ai, gisele, me poupe.]

“o que tem de urubaca torcendo pra gente não dar certo, eu tenho que levantar de figa todo dia para dizer pelo amor de deus.” ululante, lula, ululante. na língua da multidão, manja? urucubaca, mandinga, olho gordo, encosto, macumba. mas, lula, não é mandinga. é urucubaca autodirigida, é auto-sabotagem, é auto-urucubaca, encosto-em-mim-mesmo.

“temos que mostrar que na américa do sul nós não somos seres inferiores” e “o brasil tem responsabilidade com a áfrica, somos a segunda nação negra do mundo, depois apenas da nigéria.” incrível como em 505 anos de história nunca tínhamos tido um presidente que assumisse o óbvio ululante, que devolvesse a nação negra a seu devido e lindo lugar (alô, querida erika palomino, preto não é cafona, não). incrível, incrível, inacreditável.

e olha só. afinada com o coro corado lulista, a ministra de políticas de promoção da igualdade racial, matilde ribeiro, ocupou um pedação nobre de página na folha de são paulo de hoje para falar do mesmo assunto – “2005: o brasil pela igualdade racial”. olha só o que escreveu matilde: “a estrutura das instituições brasileiras permaneceu impregnada de vícios do regime escravista [alô, grace de ‘dogville’]. entrementes, o estado brasileiro, com o engajamento de setores da academia, dos partidos políticos e da imprensa, optou por negar as evidências do cotidiano, como se a hipocrisia e o passar dos anos pudessem equacionar essa disfunção estrutural da sociedade brasileira”. bravo, matilde.

só discordo de matilde num “pequeno” detalhe – em casos cruciais como esses, detalhes tão pequenos são coisas muito grandes pra esquecer. em seu artigo, a ministra concentra toda a necessidade de promoção de igualdade racial na imensa população negra brasileira (os indígenas são os outros citados, mas apenas de raspão). ok, a discriminação dos negros é proporcional ao espaço que eles ocupam geograficamente no país. mas japonês sofre de preconceito no brasil. judeu sofre de preconceito no brasil. árabe sofre de preconceito no brasil. hispânico sofre de preconceito no brasil. chinês sofre de preconceito no brasil. coreano sofre de preconceito no brasil. norte-americano sofre de preconceito no brasil. dinamarquês sofre de preconceito no brasil. etc. etc. etc.

africano não pode admitir maus tratos contra africano no brasil.

japonês não pode admitir maus tratos contra japonês no brasil.

judeu não pode admitir maus tratos contra judeu no brasil.

árabe não pode admitir maus tratos contra árabe no brasil.

hispânico não pode admitir maus tratos contra hispânico no brasil.

chinês não pode admitir maus tratos contra chinês no brasil.

coreano não pode admitir maus tratos contra coreano no brasil.

norte-americano não pode admitir maus tratos contra norte-americano no brasil.

dinamarquês não pode admitir maus tratos contra dinamarquês (alô, lars von triers de “dogville” e de “dançando no escuro”) no brasil.

etc. etc. etc.

[se possível, adoraríamos ainda por cima exercer cuidados e vigilância uns grupos sobre os outros – porque a gente adora quando tudo se mistura.]

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