Black blocs com exoesqueletos paraguaios promovem um quebra-quebra na Praça Roosevelt. Quebram motos estacionadas, partem ao meio bicicletas e skates como se fossem Doritos do Guacamole Delivery. A geringonça, que se compra até na 25 de Março, é brutalmente eficiente, mas de vez em quando dá chabu. Um dos exoesqueletos entrou em curto e o cara morreu queimado, eletrocutado, sobrou pouco dele para a autópsia eletrônica.

“Não é pelas 0,20 dracmas”, diz um cartaz de uma garota com botas de cowgirl. Na TV de vapor de água ligada na frente do bar, formigas-drones transmitem diretamente dos farelos de pão da mesa da cozinha da pin-up que ganhou o Oscar 2030.Ela sabe que está sendo estrela ao vivo de um pay-per-view da vida alheia 24 horas, mas a maior façanha da vida moderna consiste em levar a existência adiante sem nos incomodarmos mais com o fato de que tudo que fazemos é público. Tudo está sendo transmitido, e ensaístas de comunicação chamam a isso de “nova utopia” – como somos todos estrelas involuntárias de shows ao vivo, o fim das corporações de entretenimento seria iminente. Mas o faturamento ainda está lá, nas mãos dos quatro ou cinco.

E se incomodar com a perda da privacidade é o novo blah blah blah. Não há mais legislações internacionais acerca da privacidade, caducaram. Nem a morte protege mais da invasão. Breve haverá reality shows montados a partir das memórias dos mortos (como no clássico livro de Jotabê Medeiros, A Morte Engarrafada).

Outro dia, a revista Science publicou interessante estudo que mostra que o touch screen no espaço está contaminando o ar. Os computadores há muito tempo não usam mais estruturas físicas. Projetam suas telas em qualquer lugar, que são acionadas pelo toque. Nos Starbucks Coffees, aquilo que antigamente parecia um show de breakdance, com as pessoas fazendo círculos no ar com os dedos, virou agora uma infinidade de “cortininhas” de vírus. Os germes e os vírus dos dedos humanos que ficam acariciando o nada permanecem na tela virtual quando esta desaparece – um tipo de rede invisível formada pela ação gelatinosa do pulso acústico reconhecível que se usa no sistema, avaliam os cientistas. Gripes e tuberculose canina disseminam-se com facilidade incrível.


Estamos em São Paulo, que hoje parece dominada pela “poesia acre, profana e inescrutável de Lou Reed”, como escreveu um maluco canadense. A literatura está como que tomada por um desejo irresistível de repetir-se, de abdicar da imaginação
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Jotabê Medeiros, paraibano de Sumé, é repórter de jornalismo cultural desde 1986 e escritor, autor de Belchior - Apenas um Rapaz Latino-Americano (Todavia, 2017), Raul Seixas - Não diga que a canção está perdida (Todavia, 2019) e Roberto Carlos - Por isso essa voz tamanha (Todavia, 2021)

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