Quem paga e por que paga. Almir se aposentou, jovem e cheio de disposição. Comprou a preço acessível um hotel de porte médio numa cidade do interior. Além dos 20 apartamentos que, entre outros benefícios, possuem rádio AM/FM e televisão, para incrementar o recinto, de sexta-feira a domingo, dias de maior movimento, Almir contratou um trio para sonorizar com música ao vivo o restaurante do hotel, que possui 20 mesas. Almir também colocou um toca-CDs na piscina. Assim, sua vida passa tranquila, com uma ocupação já de 40% em média mensal no hotel.
Almir desconhece o que seja direito autoral, muit0 menos o que seja um agente de cobrança do Ecad. E recebe uma visita desse agente. De imediato, é informado de que tem de pagar direito autoral, pois está usando música. O agente, de posse da tabela de preços do Ecad, passa os valores: 20 quartos: R$ 138,06; restaurante (metragem de 20m x 5m, = 100m): R$ 70,56; sonorização da piscina (500m): R$ 345,15.
Conforme esse exemplo, de direito autoral Almir terá que desembolsar já no mês em curso R$ 533,77. Ao final do ano, sua despesa com direito autoral será de R$ 6.645,24.
O preço espanta Almir, pois equivale ao pagamento mensal de quase todo seu quadro funcional. Sua capacidade de lotação ainda não está completa. Ele gastou algum dinheiro com propagandas de rádio em outras cidades. Por isso tudo, reclama que não pode assumir uma dívida dessa todo mês.
Então vêm as opções. Se Almir assinar uma declaração de que não tem 50% de lotação, seu preço será reduzido à metade para os quartos, e ele pode ainda tirar a música da piscina. Nesse caso, pagará apenas R$ 70,56 do restaurante e mais o valor para dez quartos, R$ 69,03. A conta baixou de R$ 553,77 para R$ 139,59. Mas ele ainda acha caro, e resolve tirar também a música ao vivo do restaurante. Nesse caso, pagará R$ 69,03 ao mês.
Moral da história: com essa visita, o agente do Ecad conseguiu deixar três músicos desempregados, os hóspedes ficaram sem música na piscina e o dono do hotel, com um gasto anual de R$ 690,30, se não houver aumento.
Almir, que nunca tinha ouvido falar em direito autoral, já na primeira vez que teve contato com o assunto percebeu que de alguma forma mexeram no seu bolso. E, apesar de concordar em pagar pelos aposentos, exige uma série de explicações: Quem me garante que os autores recebem esse dinheiro? Para quem especificamente vai o valor que estou pagando? Como vocês sabem quais músicas eu toco aqui? Se eu não pagar, o que acontece?
Essas perguntas são inevitáveis, pois Almir não tem onde se informar. O agente do Ecad não sabe explicar com certeza as questões que Almir formulou. Almir diz que vai pensar. O agente deixa uma notificação, dando-lhe um prazo para regularizar sua situação no Ecad.
Após a saída do agente, Almir liga para o Procon. Lá, é informado de que realmente é uma lei: se ele usa música, tem de pagar. Se Almir tiver um temperamento mais explosivo, ligará na delegacia, e lá também, depois de passar por muitas pessoas, alguém lhe informará que tem que pagar. Descontente com as alegações, ele procura um advogado que, de posse da notificação, lhe informa que se trata de uma lei federal.
Sobram três opções para Almir: ou ele tira toda e qualquer música de seu hotel e não deve nada ao Ecad, ou continua usando a música e paga o valor acordado, ou continua usando sem pagar e espera para ver o que acontece.
Essa história é fictícia, mas na realidade ocorre em todos os estabelecimentos. Almir, mesmo sem entender bem, vai falar mal do Ecad. Juntando sua opinião às de outros milhares de usuários no Brasil, a difamação é uma constante na vida do Ecad.
A realidade é uma só: se você é dono, gerente ou arrendatário de um estabelecimento comercial, mesmo que não tenha nenhum benefício financeiro com o uso da música, terá que pagar.
Suponha que é aniversário do seu filho. Opção 1: se a festa for na sua casa com livre ingresso dos seus convidados, você não paga nada. Opção 2: se a mesma festa foi transferia para um pequeno clube da cidade, com livre acesso aos convidados, você pagará R$ 200 de aluguel ao clube, e o valor do direito autral será de 10% do aluguel, ou seja, R$ 20. Se houver música mecânica ao vivo, paga 15%, ou seja, R$ 30.
Você pode se perguntar: e se o clube não cobrar nada para que eu faça a festa do meu filho lá? Resposta: se ele cobra o aluguel de R$ 200 para locar o clube, mas não cobrou de você, isso não importa: você paga 10% ou 15% do mesmo jeito. A única isenção ocorre se a utilização for no recinto familiar.
As formas de cobrança. O Ecad tem um regulamento de arrecadação que é aplicado quando se faz a cobrança. Esse regulamento é elaborado pela Assembleia Geral, que é composta pelas sociedades. O escritório tem uma tabela de preços extensa e às vezes confusa. Seus critérios de cobrança são os seguintes.
Utilização eventual (show, baile, festa etc., realizados esporadicamente):
Por bilheteria: Se você tem algum tipo de retribuição (cobrança de ingresso, cobrança de couvert artístico, compra de camiseta, boné ou outra indumentária) pelo ingresso no recinto, pagará 10% da bilheteria, se houver música ao vivo, e 15% se houver música mecânica. Exemplo:
Show: Rio Negro & Solimões; ingressos colocados à venda: 10 mil; preços: R$ 5 antecipado, R$ 10 na hora.
Opções fornecidas pelo Ecad:
a) Garantia mínima de 30% dos ingressos colocados à venda, pela média de preços: R$ 5 + R$ 10 = R$ 15, dividido por 2, média de R$ 7,50. R$ 7,50 multiplicado por 3 mil ingressos = R$ 22.500. Você irá recolher antes do show R$ 2.250, e um fiscal do Ecad irá acompanhar a bilheteria no dia do evento. Supondo que do total de 10 mil ingressos foram vendidos 7.000, sendo 1.500 antecipados e 5.500 na hora do evento, a renda apurada foi de R$ 5 multiplicados por 1.500 (= R$ 7.500 mil), mais R$ 10 multiplicados por 5.500 (= R$ 55 mil). Total apurado: R$ 62.500. Você terá de pagar ao Ecad R$ 6.250. Como já antecipou R$ 2.250 de garantia mínima, deve então a diferença de R$ 4.000 mil.
b) Pagamento total antecipado: o total de ingressos colocados à venda foi de 10 mil. Para que esse pagamento possa ser feito no total e sem contar com a apuração da bilheteria, você terá de imediato 30% de desconto sobre os ingressos colocados à venda. Portanto, 10 mil ingressos com desconto de 30% = 7.000 ingressos, multiplicados por R$ 7,50 (média do valor dos ingressos). Nessa opção, você terá que pagar antes do show R$ 5.250. Esse exemplo serve para qualquer utilização com cobrança.
O dilema do usuário que realizou esse show é o seguinte: ele só teria algum lucro caso vendesse os 10 mil ingressos. Caso tenha vendido apenas 5.000 ingressos e tenha optado pelo pagamento antecipado, o Ecad não irá lhe devolver o dinheiro. Caso tenha optado por ser apurada a bilheteria e não tenha alcançado nem sequer a garantia mínima que já pagou antecipadamente, o Ecad terá que lhe devolver o dinheiro, mas quando for realizado outro show. Como se pode observar, é um jogo: ou arrisca ou corre o risco.
Há outros tipos de caso. Conheci certo produtor de festa de peão que só realizava o evento uma vez por ano. Ele fez a opção por pagar uma garantia mínima, e o Ecad, de realizar a apuração da bilheteria. Isso aconteceu porque o promotor não acreditava que o valor estimado pelo Ecad, de R$ 15 mil, fosse viável. O promotor ofereceu o pagamento antecipado de R$ 12 mil. Não fecharam acordo. Oprodutor recolheu R$ 5.000 como garantia mínima, e a bilheteria foi apurada.
O total de pessoas da festa foi de 30 mil em seis dias de evento, com ingresso aR$ 10 por pessoa. O débito desse usuário seria de R$ 25 mil, pois já havia recolhido a garantia mínima. Ocorre que o produtor não recolheu nada após o evento. Aquele ano terminou, outro começou e novamente outra festa iria acontecer. O promotor corria o risco de uma medida cautelar, solicitando o interdito da festa ou a apreensão da bilheteria.
O produtor procurou o Ecad, e dos R$ 25 mil que devia do ano anterior, conseguiu baixar para R$ 11 mil. Teve, portanto, um bom desconto. Mas isso não é tudo: conseguiu também parcelar o débito em dez vezes, e a festa que iria promover de imediato, que em nada era diferente da anterior, ficou por R$ 10 mil, pagos antecipadamente. Viu como o Ecad é bonzinho?
Em casos de show gratuito em praça pública, baile sem cobrança etc., você não cobrou absolutamente nada para que as pessoas ingressem no evento. Nesse caso, o valor do direito autoral será calculado ou pelo espaço ocupado ou pelo número de pessoas que cabe no espaço. Essa cobrança chama-se Parâmetro Físico, e teremos que usar a UDA (Unidade de Direito Autoral). Suponhamos que a UDA seja de R$ 15,34 para cada dez metros. Veja como é:
Comício do candidato a governador James Gurizinho, com show da dupla Rino & Reno. A praça escolhida para o comício tem 100 metros de comprimento por 100 metros de largura, o que equivale a um espaço de 1.000 metros.
Quanto vai custar esse show para o candidato? 10 mil metros divididos por 10 = 1.000, multiplicado por 1,09 (fator preço de tabela) = 1.090, multiplicado por R$ 15,34 (UDA) = R$ 16.720.
Parece que ficou muito caro, então vamos tentar de outro jeito, também previsto na tabela: você pode calcular por estimativa de público.
O Ecad calcula que caibam 3 pessoas por metro quadrado. A praça onde o comício será realizado tem 10 mil metros, mas o público esperado é de somente 3.000 pessoas, então como fica? 3000 dividido por 3 (pessoas por metro) = 1.000 metros. O cálculo vai ficar bem melhor e o preço também: 1.000 dividido por 10 = 100, multiplicado por 1,09 (tabela de preços) = 109, multiplicado por R$ 15,34 (UDA) = R$ 1.672.
Veja como diminuiu o valor que o candidato terá que pagar. E se, mesmo reduzindo esse valor, o candidato se recusar a pagar, o que acontece? Veremos em outro capítulo. Agora vamos tratar de outro tipo de cobrança.
Utilização permanente
Esse usuário é aquele que usa música em seu estabelecimento constantemente. Para ser permanente, o usuário precisa ter no mínimo oito funções por mês, no mesmo local. O usuário permanente também pode ter cobrança de ingresso. Vejamos como funciona:
Um clube social que tem 500 associados pagando uma mensalidade de R$ 21 tem uma receita bruta de R$ 10.500 por mês.
a) Por receita: R$ 10.500 multiplicado por 1,5% = R$ 157 ao mês (se não houver dança e só utilizar sonorização ambiental); R$ 10.500 multiplicado por 2,6% = R$ 273 ao mês (se houver dança e música ao vivo); R$ 10.500 multiplicado por 3,9% = R$ 409,50 ao mês (se houver dança, música ao vivo e música mecânica).
b) Por Parâmetro Físico: O clube tem um salão social com 300 metros quadrados, divididos por 10 = 30 multiplicado por 1.6 (fator tabela) = 48 multiplicado por R$ 15,34 (UDA) = R$ 736 por mês (se não houver dança e só usar sonorização ambiental); 30 multiplicado por 2,16 (fator tabela) = 64,8 multiplicado por R$ 15,34 (UDA) = R$ 994,03 por mês (se houver dança e música ao vivo); 30 multiplicado por 3,25 (fator tabela) = 97,5 multiplicado por R$ 15,34 (UDA) = R$ 1.495,65 ao mês (se houver dança, música ao vivo e música mecânica).
Nos dois casos, só vale se o clube não cobrar ingresso para os bailes. Se fizer oito bailes sem cobrança e um baile com cobrança para os associados, paga a mensalidade mais 10% do que arrecadou no baile com cobrança. Com música ao vivo, se for mecânica, paga 15%.
Ainda que o usuário seja permanente e pague uma mensalidade ao Ecad, no caso de intencionar fazer os eventos abaixo, tem que pagar à parte. São eles: réveillon, pré-carnaval, carnaval, baile de aleluia, baile junino.
No mês em que você fizer o baile de carnaval, terá que pagar, além da mensalidade, o valor do baile. É só seguir os exemplos já mencionados e verificar na tabela de preços os fatores de multiplicação para que se chegue ao preço final.
Alguns clubes, para realizar esses eventos, precisam fazer a decoração do salão, e nesse período não serão realizadas as funções dançantes rotineiras, pois o salão estará ocupado. O clube paga a mensalidade e paga também o valor cobrado para o carnaval. Isso não está correto. Sabendo que o Ecad não cobra imposto, mas sim uma taxa pela utilização do repertório que protege, se não está sendo utilizado repertório algum durante o mês não se deve pagar a mensalidade, e sim o valor que ficar combinado para os bailes de carnaval. As duas taxas só serão pagas se as funções dançantes permanecerem normais.
Quando digo que há uma certa confusão na tabela de preços, explico: a tabela diz que os eventos especiais promovidos pelo clube ou qualquer atividade com cobrança de ingresso estará fora da mensalidade, como, por exemplo, os shows, bailes com cobrança ou qualquer atividade com cobrança. Logo, os eventos que não têm cobrança estariam dentro da mensalidade, e a questão é: por que o Ecad, mesmo sabendo que um clube que paga a mensalidade está realizando um show sem cobrança de ingresso, visita esse clube para cobrar o show?
Existe na tabela também um item chamado festas de peão, só eventual ao preço de 10% da receita. Na mesma tabela existe um item chamado de exibições e concursos, que diz que com cobrança de ingresso e com música ao vivo o valor é de 2,5% da receita bruta. Então eu pergunto: o que é uma festa de peão, senão um concurso de montaria onda há prêmios para no mínimo dez categorias?
Outro item importante refere-se aos ingressos de cortesia. Se você realizou uma festa com cobrança de ingresso e colocou à venda 5.000 ingressos, mas desse total vendeu 4.000 e deu de cortesia os outros 1.000, o Ecad irá considerar apenas 10% dos ingressos vendidos como cortesia, nesse caso 400 ingressos. Isso quer dizer que você, que promoveu a festa, terá que pagar o valor correspondente ao direito autoral dos outros 600 ingressos, ao preço praticado.
Por exemplo: 4.000 multiplicado por R$ 5 = R$ 20 mil, multiplicado por 10% a recolher = R$2.000. 1.000 cortesias menos 400 (10% dos ingressos vendidos) = 600, multiplicado por R$ 5 = 3.000. A recolher por cortesias = R$ 300.
Seguindo os exemplos acima, será fácil fazer o cálculo para qualquer estabelecimento, seja ele mensalista ou eventual. Tente algumas vezes e logo saberá calcular. Você só precisa ter em mãos o valor atualizado da UDA, fazer os cálculos e negociar. Temos em outro capítulo uma explicação de cada item da tabela e alguns exemplos. Tente calcular. Não esqueça o desconto referente ao nível populacional e categoria sócio-econômica.
(Terceiro capítulo do livro Do Outro Lado do Ecad – Tudo Sobre Direito Autoral de Música (MedJur, 2004). A autora, Sandra Véspoli, que trabalhou no Ecad desde sua fundação, autorizou a adaptação de seu trabalho por FAROFAFÁ, com o objetivo de diminuir a lacuna de literatura de referência sobre o assunto no Brasil.)
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