Neste ano, 63 filmes nacionais participaram da 43ª Mostra Internacional de Cinema, e ainda dá tempo de ver alguns deles nos últimos dias do evento. Entre os destaques estão documentários brasileiros que buscam iluminar as trevas que assombram o País. Um deles, certamente, é Chão, de Camila Freitas. A resiliente diretora acompanhou por longos quatro anos os sem-terra que ocupam a Usina Santa Helena, de uma empresa de agronegócio endividada no sul de Goiás. Por ironia, ao finalizar o filme em dezembro, a situação dos trabalhadores rurais continuava a mesma. Mas, com a ameaça nominada, nos letreiros, da eleição de Jair Bolsonaro, inimigo declarado do Movimento dos Sem-Terra.
Acima de tudo, Chão (dias 27, 28 e 30 de outubro) tem o mérito de ouvir apenas o lado dos agricultores familiares, o que pode dar a impressão de ser um filme parcial. E é. Camila tem paciência em escutar o que esses trabalhadores têm a dizer, ao contrário da imprensa que raramente dá espaço a eles. E isso sem que a câmera da cineasta pareça estar presente, passeando em ritmo lento pelos desejos, planos e lutas por uma agricultura mais sustentável.
Entre os documentários brasileiros na Mostra Internacional de Cinema está O paradoxo da democracia (28 de outubro), de Belisario Franca. O filme é generoso ao ouvir diferentes intelectuais sobre o que pensam sobre o regime político nos tempos atuais. Além de um filósofo francês como Jacques Rancière, o filme ouve também o brasileiro Luiz Felipe Pondé. A lista de entrevistados segue com nomes como os espanhóis Juan Carlos Monedeiro, do Podemos, e Esther Solano (colunista da CartaCapital), o norte-americano Steven Levitsky e os brasileiros Angela Alonso e Sergio Besserman. A narrativa, que intercala imagens de protestos em diversos países, procura mostrar que a democracia respira por aparelhos. E o recado é simples: assim como ela é uma invenção da sociedade, pode muito bem ser substituída se não for aperfeiçoada a tempo.
Tensão eleitoral
Outubro (dias 25, 26 e 29) traz os registros feitos pela atriz e escritora Maria Ribeiro, que dirige e assina o filme com Loiro Cunha, uma semana antes da eleição de Bolsonaro. Maria Ribeiro mostra o calor das campanhas nas ruas, intercalando entrevistas de personalidades e traçando um paralelo entre as perspectivas sombrias do país e o fim de um casamento. Já o diretor Paulo Caldas, de Abismo Tropical (28, 29 e 30), apresenta um artista que narra, em primeira pessoa, o que simbolizou o dia da eleição de Bolsonaro em 2018. Em exibição nos dias 27, 28 e 29, Amazônia Sociedade Anônima, de Estêvão Ciavatta, decifra didaticamente a lógica mercantil da devastação da floresta tropical. O documentário entrevista especialistas, mas vai além mostrando como populações tradicionais lutam para enfrentar os grileiros na Amazônia que têm a benevolência do atual governo.