Doutorado direto e equidade em concursos públicos: um debate incômodo, mas necessário

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Ilustração de Mariza Dias Costa

Por: Matheus Medeiros

Candidatos que possuem a mesma qualificação deveriam receber a mesma pontuação em provas de títulos de concursos públicos, certo? Bom, pelo menos, isso é o que diz o senso comum, embora ainda não seja a prática corrente adotada em todos os processos seletivos para provimento de cargos de professores doutores em universidades públicas brasileiras.

Chama atenção, em particular, a persistência do “contencioso” caso do chamado “Doutorado Direto.” Essa modalidade de doutoramento, amplamente reconhecida pelo sistema educacional brasileiro (CAPES, Resolução no 7, de 11 de Dezembro de 2017, art. 10), pelas agências de financiamento (como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), e totalmente normal no cenário estrangeiro, equivale, fundamentalmente, à obtenção do título de doutor sem que seja necessário obter previamente o título de mestre. Isso ocorre, amiúde, por meio de convite formulado ao candidato de mestrado na qualificação, a fim de que o estudante transforme o material apresentado para a dissertação diretamente numa tese. Na Universidade de São Paulo, por exemplo, a conversão para o Doutorado Direto implica a comprovação de proficiência em mais uma língua, a realização de mais créditos e a requalificação, além, é claro, da defesa da tese de doutorado, e geralmente tem uma duração mais longa do que o Doutorado Regular.

Por óbvio, um tal convite decorre da alta qualidade do material apresentado na qualificação, que é reputado pelo júri de qualificação de mestrado como digno de ser “convertido” em Doutorado, “pulando uma etapa”, por assim dizer. Há também casos nos quais um pesquisador pleiteia diretamente a realização do doutorado desde o início, sem ter que passar pelo mestrado, o que pode ocorrer em algumas instituições, como a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Em ambos os casos, realizar o Doutorado Direto implica elevada maturidade do pesquisador envolvido, e é um sinal de reconhecimento acadêmico e de mérito.

Em 2025, segundo o jornal O Estado de S. Paulo, houve uma reformulação na política de seis universidades paulistas, estaduais e federais (Unesp, Unifesp, UFSCAR, UFABC, Unicamp, USP), apoiada por entidades como CAPES e FAPESP, que permitirá o doutoramento após um ano de mestrado por meio de uma conversão na qualificação, o que, por conseguinte, tornará cada vez mais comum o caso do “Doutorado Direto”. Ainda que os méritos desse novo protocolo específico possam ser discutidos, em particular em razão da generalização dessa conversão, outrora excepcional, fato é que o Doutorado Direto integrará cada vez mais a realidade do cenário educacional brasileiro.

Em duas excelentes publicações datando, respectivamente, de 2022 e 2024, o professor Antônio David, atualmente docente da Unicamp, mostrou como as universidades brasileiras frequentemente criavam mecanismos para penalizar o doutor que tinha realizado Doutorado Direto. Tais mecanismos envolviam desde impedimentos à inscrição em concursos ou à posse por meio da exigência do título de mestre, até distorções na contagem da pontuação das provas de títulos, o que geralmente se dá por meio da contabilização de pontos adicionais para o título de mestre nos baremas. Esses expedientes, é claro, são indiretos, criando assimetrias entre os dois doutores por meio da cobrança do mestrado. Uma vez que não é possível distinguir os dois diplomas de doutor apenas pelo título em si, muitas universidades optam por dar peso adicional ao mestrado, o que, na prática, favorece aqueles que realizaram mestrado como requisito do doutorado, já que, é evidente, o detentor de Doutorado Direto não terá mestrado. A consequência é que dois doutores com a mesmíssima qualificação são tratados de forma desigual, porque se valoriza mais aquele que tem, adicionalmente, o título (inferior) de mestre.

Esse expediente, em razão da evidente quebra de isonomia gerada entre dois tipos idênticos de doutores, foi questionado nos tribunais brasileiros, que, em diversas decisões, deram razão àqueles que detinham Doutorado Direto, outorgando-lhes pontuação equivalente à soma do Mestrado e Doutorado. A jurisprudência foi devidamente reunida pelo professor Antônio David nos dois artigos mencionados, sendo particularmente relevantes os seguintes processos:

0006678-09.2018.4.02.0000 (TRF-2)

5007231-35.2022.4.03.6100 (TRF-3)

e 0007472-29.2005.8.14.0301 (TJPA).

Os argumentos jurídicos, amparados, em um dos casos (o do TRF-3; leia ao final deste artigo), em pareceres técnicos de notáveis professores brasileiros, como Paulo Arantes, Marco Zingano e Marilena Chauí, concluíram que: (i) a atribuição de pesos injustos e irrazoáveis em provas de títulos pode, sim, ser objeto de controle judicial; (ii) a atribuição de pontos adicionais ao título de mestre, sem que o doutorado direto tenha tratamento equitativo, fere a isonomia do concurso; (iii) o doutorado direto deve ser considerado como a soma de mestrado e doutorado para fins de pontuação em concursos públicos, quando isso for necessário para manter a isonomia na pontuação de dois candidatos com a mesma qualificação.

Recentemente (11/2024), um concurso realizado pela UERJ, do qual participei, continha em seu barema a contagem de título de mestre. O título de doutor em si era apenas pré-requisito para a inscrição, mas não pontuava. Com a computação do mestrado de forma apartada, o resultado da prova de títulos, sem levar em consideração o princípio da isonomia – aliás, previsto no Edital – prejudicava aqueles que haviam feito doutorado direto, porque o barema do certame atribuía nota de 40 pontos ao título de mestre (que correspondia a 40% da nota do Grupo I). É simples: se um doutor tem Doutorado Regular, ele necessariamente terá o título de mestre, pois o título de mestre é pré-requisito do título de doutor que ele usará para se inscrever. Destarte, ele pontuará 40 pontos a mais do que o doutor que fez Doutorado Direto, apesar de ter exatamente o mesmo nível de qualificação do que este.

No caso em tela, eu informei e comprovei, tanto à Comissão Examinadora quanto ao Conselho Departamental, em diversos momentos, que meu doutorado era um doutoramento direto, e que, portanto, não teria lógica me penalizar pela falta do título de mestre. Apesar de não ter obtido sucesso no reconhecimento desta equivalência junto às instâncias deliberativas da universidade, uma importante manifestação no processo veio por parte do órgão jurídico da UERJ, a Procuradoria Geral. Tendo sido consultada especificamente quanto ao meu pedido, que dizia, entre outras coisas, que “segundo o entendimento do judiciário, o Doutorado Direto corresponde a Mestrado e Doutorado para fins de pontuação em concursos”, a Procuradoria Geral emitiu uma manifestação que deverá se somar aos antecedentes legais para futuros casos similares, deixando claro que prejuízos decorrentes da realização de doutorado direto devem ser remediados por meio de tratamento equitativo.

Manifestação.UERJ/PGUERJ09 SEI No 3010
Rio de Janeiro,18 de dezembro de 2024

À ilma. Procuradora-Chefe da PG-09, (…)

Por fim, quanto à pretensão de revisão da nota atribuída aos títulos,
esclarece-se que não há nos autos qualquer informação relativa aos
motivos da pontuação conferida ao candidato. Assim, a presente
resposta, se dá apenas com base na argumentação apresentada pelo
recorrente.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei no
9.394/1996) não faz uma distinção expressa entre o doutorado direto e
o doutorado precedido de mestrado. Em vez disso, a LDB estabelece as
diretrizes gerais para a educação superior e os cursos de pós-graduação
stricto sensu, deixando a normatização específica para órgãos como o
Conselho Nacional de Educação (CNE) e a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Nesse contexto, a Resolução no 7, de11 de dezembro de 2017, em seu
art.10, expressamente eprevê o doutorado direto, nos seguintes termos:
Art. 10 Aos cursos de doutorado regulares é admitido,
excepcionalmente, conceder título de doutor mediante defesa
direta de tese.

Parágrafo único. O disposto no caput só poderá ocorrer em curso de
doutorado regular na mesma área do conhecimento da tese apresentada.
Considerando que ambos os títulos acadêmicos são equivalentes, é
descabido estabelecer qualquer diferenciação entre eles para fins de
atribuição de pontos, especialmente porque o edital também não prevê
essa distinção. Portanto, caso a pontuação atribuída ao
recorrente tenha sido reduzida por seu título de doutor
decorrer de um doutorado direto, tal discriminação é
inadequada, pois viola os princípios da isonomia e da
igualdade, devendo a Comissão Examinadora proceder à
revisão da pontuação atribuída.


Jorge Paz Soldan de Albuquerque, Procurador da UERJ, Mat. 41.259-3.

Como disse, apesar do entendimento da PGUERJ, que deve ser reconhecido como boa técnica jurídica, houve resistência ao reconhecimento desse tratamento isonômico pelas instâncias deliberativas da UERJ. Além de argumentos que simplesmente ignoravam o fato de que o Doutorado Direto, igual ao Doutorado Regular, careceria evidentemente de título de mestre, apesar de lhe ser equivalente, houve alguns outros argumentos apresentados. Uma alegação que me chamou a atenção por sua franqueza foi a seguinte: “O fato do candidato ter realizado o seu doutorado diretamente, sem que este fosse antecedido por um mestrado, foi uma opção do mesmo, cabendo a esse todos os ônus e bônus decorrentes dessa sua opção pessoal” (Parecer em Ata de Reunião Extraordinária do Conselho Departamental do IFCH de 15 de janeiro de 2025).

A fala é importante porque expressa uma visão que, embora raramente manifestada em documentos oficiais, é a que efetivamente sustenta a persistência do desmerecimento do Doutorado Direto nas universidades brasileiras hoje. Ora, decerto se perceberá, de plano, que o teor desse argumento não tem nada de jurídico ou acadêmico, mas é precipuamente moral. Academicamente, é comprovado que o Doutorado Direto decorre de mérito, o que é amparado pelo regime educacional brasileiro e valorizado, conforme reconhecido por diversas portarias da CAPES e diretivas de outras agências. Confira-se, por exemplo:

Portaria Nº 077, de 15 de agosto de 2006

Estabelece critérios para concessão de bolsas a alunos promovidos antecipada e diretamente do
mestrado para o doutorado.

O Presidente da FUNDAÇÃO COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE
PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR – CAPES no uso das atribuições conferidas pelo
Estatuto aprovado pelo Decreto nº 4.631, de 21 de março de 2003 e considerando:
que a promoção de bolsistas do mestrado para o doutorado implica em custeio adicional para alocação de novas bolsas,
RESOLVE:
Art. 1º Fica estabelecido que na mudança de nível do aluno matriculado no
mestrado para o doutorado, deverão ser observadas pelos Programas de Pós
Graduação as regras estabelecidas nesta Portaria.
Art. 2º A mudança de nível do mestrado para o doutorado deve resultar do
reconhecimento do desempenho acadêmico do aluno observados os seguintes
critérios:
I – que a condição de desempenho acadêmico excepcional atingido pelo aluno,
tenha sido obtido até o décimo oitavo mês do início do curso;
II – que o desempenho acadêmico do aluno na obtenção dos créditos no
desenvolvimento da respectiva dissertação, inequivocamente demonstrado no
currículo do aluno, seja compatível com o mais elevado padrão exigido pelo curso
para a conclusão não antecipada do mestrado;
III – que a instituição-sede do Programa de Pós-Graduação tenha autorizado o
ingresso do aluno no doutorado.
Parágrafo primeiro. O limite anual de promoções permitido para os bolsistas
CAPES é de 3 (três) alunos ou até 20% dos bolsistas da agência, matriculados no
nível de mestrado.
Parágrafo segundo. O aluno beneficiado com a promoção antecipada para o
doutorado deve manter junto ao curso e a Capes o compromisso de concluir, no
prazo máximo de três meses, a partir da data da seleção para a referida promoção, o
seu programa de mestrado, inclusive com a respectiva redação e defesa da
dissertação, nos moldes estabelecidos pelo curso para a conclusão do mestrado não
antecipado.
Art. 3º Os alunos-bolsistas da CAPES promovidos pelos Programas de Pós
Graduação nas condições estabelecidas nesta Portaria, terão suas bolsas
complementadas para o nível de doutorado, por até quatro anos, a partir da referida
promoção.
Art. 4º Os Programas de Pós-Graduação enviarão à CAPES, num prazo máximo
de 15 (quinze) dias, a lista dos alunos-bolsistas promovidos, para efeito de
transformação da cota de bolsas do curso do nível de mestrado para o doutorado.
Parágrafo único. A possibilidade de reposição ao curso da cota de bolsa de
mestrado transformada em cota de doutorado, em razão de tais promoções, somente
poderá ocorrer quando da distribuição de novas cotas no início do período letivo do
ano seguinte, sempre condicionada à disponibilidade de recursos da agência.
Art. 5º Esta portaria entra em vigor na data de sua publicação.

JORGE ALMEIDA GUIMARÃES
Presidente da CAPES

Logo, a opção por fazer um Doutorado Direto é tão somente a aceitação de um reconhecimento por mérito, além de envolver, quando muito, cálculos pessoais de conveniência quanto à remuneração, tempo de conclusão e esforços a serem despendidos pelo pesquisador. Em outras palavras, não deveria haver nenhum “ônus” em processos seletivos por se cursar um Doutorado Direto, já que o Doutorado Direto equivale a reconhecimento de mérito e corresponde à mesmíssima qualificação do Doutorado Regular. Logo, alegar que há um “ônus” em se optar por cursar o Doutorado Direto é reconhecer, aí sim, uma opção ilegítima, por parte da universidade, em penalizar o doutoramento direto pela ausência de Mestrado, apesar de saber-se, indubitavelmente, que o doutoramento direto é superior e engloba o Mestrado, não tendo nenhum demérito em relação ao Doutorado precedido de Mestrado – talvez até mesmo fosse o contrário.

Do ponto de vista jurídico o argumento também não se sustenta. Em primeiro lugar, o ordenamento jurídico brasileiro alberga como valores a isonomia, a legalidade, o acesso igualitário aos cargos públicos e o mérito, princípios que, quando levados conjuntamente em consideração, não permitem que qualquer critério de seleção prejudique profissionais que sabe-se terem a mesma qualificação. Em segundo lugar, embora haja certa discricionariedade nos critérios de baremas de processos seletivos universitários, tal discricionariedade não pode atingir um patamar de irracionalidade tal que dispense justificativa razoável, além de não poder ignorar as particularidades do
caso concreto, em respeito à noção de equidade.

O argumento é, portanto, moral. Ele envolve a concepção latente de que, ao fazer um doutoramento direto, o pesquisador cometeu um ato de hýbris, isto é, soberba, e que, portanto, deve ser punido de alguma forma por isso, mesmo que por critérios injustos e assimétricos. Dispensa-se, assim, o recurso à argumentação lógica em favor de uma punição pela percebida arrogância daquele que se doutorou diretamente.

Em suma, estamos diante de um debate que precisa enfrentar posturas não necessariamente racionais, mas culturalmente arraigadas, relativas a concepções morais quanto a supostas escolhas que independem do caráter objetivo da qualificação sob exame. É por isso que os que fizeram doutoramento direto não podem, em nenhuma hipótese, abdicar de seu direito ao tratamento equitativo, devendo recorrer aos direitos legalmente reconhecidos para evitarem tratamentos injustos.

Matheus Medeiros é Doutor em História Social pela USP, bacharel em Direito pela USP e Pós-Doutorando na USP (FAPESP, processo nº 2022/07801-8). 

DECISÃO DO TRF 3


Tribunal Regional Federal da 3a Região – 3a Turma, APELAÇÃO CÍVEL (198) No 5007231-
35.2022.4.03.6100: PROCESSO SELETIVO SIMPLIFICADO PARA CONTRATAÇÃO DE
PROFESSOR SUBSTITUTO DO DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SÃO CARLOS (SUBÁREA “HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA E
CONTEMPORÂNEA”). CERTAME CONSTITUÍDO DE FASE ÚNICA (ANÁLISE DE
CURRÍCULO). PONTUAÇÃO DE TÍTULOS. ATRIBUIÇÃO DE DOIS PONTOS, DOS DEZ EM
DISPUTA, AOS CANDIDATOS QUE CURSARAM “DOUTORADO PRECEDIDO DE
MESTRADO”, EM DETRIMENTO DAQUELES QUE CURSARAM “DOUTORADO DIRETO”.
MANIFESTA CONTRARIEDADE AO SISTEMA DE MÉRITOS DA LEI 9.394/1996, ALÉM DA
VIOLAÇÃO AOS POSTULADOS DA ISONOMIA E DO AMPLO ACESSO AOS CARGOS
PÚBLICOS. RECURSO PROVIDO. 1 – É firme a orientação do STJ no sentido de que as regras
estabelecidas em editais de certames públicos não são absolutas, devendo ser observados os
parâmetros estabelecidos no ordenamento jurídico. Precedentes. 2 – De há muito, o STF tem
sólidos precedentes, nas mais diversas questões, no sentido de que a autonomia das universidades
não lhes confere soberania para “escolher” a quais leis devem se submeter. Por fazer parte da
Administração, a elas se aplicam todos aqueles postulados aplicáveis à Administração Pública (art.
37, CF), notadamente o da legalidade. Precedentes. 3 – A jurisprudência dos tribunais,
notadamente do STF, tem entendido que (1) a exigência de títulos injustificáveis (titulação
desnecessária), (2) a atribuição supervalorizada de pontos em situações que não se justificam
(supervalorização de pontos), (3) a atribuição de caráter eliminatório à prova de títulos (ou a
adoção de fórmula matemática que conduza a tal resultado) ou (4) a rejeição de títulos em
situações que ampliam a competição entre os candidatos fraudam o preceito constitucional que
assegura o amplo acesso aos cargos públicos, restringindo indevidamente a competitividade (art.
37, II, da CF), além da manifesta afronta ao postulado da isonomia. 4 – Caso em que candidato
ao cargo de professor substituto teve subtraído dois pontos (de um total de dez) da tabela de
pontuação, por não ter cursado mestrado antes da conclusão de seu doutorado (“doutorado
direto”), por mérito próprio reconhecido por banca examinadora especial da Universidade de São
Paulo. 5 – O mérito acadêmico, seja na fase de graduação, seja na de pós-graduação, é
amplamente reconhecido pelo legislador (art. 47, § 2o, da Lei 9.394/1996 – Os alunos que tenham
extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros
instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter
abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino) e
confirmado pela jurisprudência, de modo que revela-se ilegal o comportamento da universidade
em discriminar, às avessas, o mérito do candidato que comprovou, a mais não poder, ter a mesma
qualificação (no mínimo) dos candidatos que cursaram o mestrado, sendo abusiva a destinação
de dois pontos (dos dez em disputa) aos candidatos que concluíram o doutorado precedido de
mestrado. 6 – Recurso provido. Pedido de antecipação da tutela recursal prejudicado. (…) O
Departamento de Filosofia escolheu pontuar o título de “Mestrado em Filosofia” com 2 (dois)
pontos (numa escala de 0 a 10), gerando uma grave distorção em relação aos candidatos (como o
impetrante) que fizeram o “doutorado direto”, pois os detentores de doutorado precedido de
mestrado largaram dois pontos à frente, podendo chegar a um total de dez pontos, em detrimento
daqueles que não fizeram o mestrado, que poderiam alcançar, no máximo, oito pontos.
Aduziu
que essa distorção gera manifesta vulneração ao postulados da isonomia e da razoabilidade, na
medida em que o “doutorado direto” é reconhecidamente um mérito daqueles estudantes que
apresentam uma pesquisa de alto nível e de excepcional qualidade, tornando dispensável o
mestrado, o que é reconhecido por agências de fomento como a FAPESP (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo) e a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior), bem como profissionais de renome, conforme oito pareceres técnicos que
apresenta, que atestam que o “mestrado” não representa uma qualificação a mais de um doutor
que realizou o “mestrado” antes do “doutorado”, mas apenas uma “qualificação anterior e
inferior”, de modo que, entre dois doutores, um “com mestrado” e outro “sem mestrado”, ambos
têm igual qualificação. (…) Ainda para robustecer o seu argumento (de que não existe qualquer
diferença entre as titulações), o impetrante juntou declarações de eminentes professores que
atestam – consideradas apenas as duas titulações (doutorado precedido, ou não, de mestrado,
não sendo este uma qualificação adicional àquele) – não haver qualquer diferença entre as duas
titulações e, até mesmo, ser o “doutorado direto” um mérito do aluno que sequer precisou do

mestrado para atingir o doutorado. São eles: 1) Marco Antônio de Ávila Zingano, Professor Titular
do Departamento de Filosofia – FFLCH / USP (fls. 84-PJe – ID Num. 267687702 – Pág. 2); 2)
Marilena Chaui, Profa. Dra. do Departamento de Filosofia FFLCH / USP, Ex-orientadora do Dr.
Antonio David e responsável por sua passagem ao doutorado direto (fls. 85-PJe – ID Num.
267687702 – Pág. 3); 3) Tessa Moura Lacerda, Profa. Dra. do Departamento de Filosofia FFLCH
/ USP (fls. 86-PJe – ID Num. 267687702 – Pág. 4); 4) Prof. Dr. Marcos Ferreira de Paula – docente
de filosofia da Universidade Federal de São Paulo (fls. 87-PJe – ID Num. 267687702 – Pág. 5); 5)
Paulo Eduardo Arantes, professor aposentado Senior da FFLCH USP (fls. 89-PJe – ID Num.
267687702 – Pág. 7); 6) Sérgio Cardoso, Prof. Sênior do Departamento de Filosofia da FFLCH –
USP (fls. 90-PJe – ID Num. 267687702 – Pág. 8); 7) Prof. Dr. Homero Silveira Santiago,
pesquisador e professor do Departamento de Filosofia da FFLCH – USP (fls. 91-PJe – ID Num.
267687702 – Pág. 9); e 8) Prof. Dr. Fernando Dias Andrade – Professor associado IV de História
da Filosofia na Universidade Federal de São Paulo (fls. 92-PJe – ID Num. 267687702 – Pág. 10).
Tenho, pois, por violados os postulados da legalidade, da isonomia no tratamento entre os
candidatos e do amplo acesso dos administrados aos cargos públicos, posto que o reconhecimento
do mérito é situação amplamente acolhida pela lei, cuja aplicabilidade prática não pode ser
negada pelo administrador público.
2 Tribunal de Justiça do Pará, Apel. 2013.04125390-73. Rel. Des. Leonam Gondim da Cruz Junior,
3a Câmara Cível Isolada, j. 2013-04-25, p. 2013-05-06: “Outrossim, destaco que, se foi guindado
pela própria USP ao Doutorado Direto, não pode vir a ser prejudicado (…) concluo que o Apelado
foi premiado com tal dispensa, como incentivo à produção intelectual e científica de interesse
social, não cabendo, portanto, qualquer forma de prejuízo decorrente da ausência do referido
diploma. Entendo que neste caso em particular, o diploma de conclusão do doutorado engloba
também o de mestrado.”

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