Morreu neste sábado, 18, aos 68 anos em São Sebastião, no litoral de São Paulo, o cineasta Toni Venturi, diretor do premiado Cabra Cega (2004), que ganhou 25 prêmios cinematográficos. O diretor sentiu-se mal enquanto nadava em uma praia de São Sebastião, foi atendido mas não puderam salvá-lo. Ele era casado com a atriz Debora Duboc e tinha um filho. Seu corpo será velado nesta segunda-feira (20), entre 13 horas e 20 horas, na Cinemateca Brasileira, na Vila Mariana, em São Paulo.
Toni Venturi viveu no Canadá de 1976 até 1984, onde se graduou Bacharel em Artes Fotográficas e Cinema pela University Of Ryerson, de Toronto. Também formou-se em Comunicação Social (Cinema) pela Universidade São Paulo, em 1987. Depois da passagem pelo Canadá, viveu no Rio de Janeiro até 1989 e voltou a viver em São Paulo em 1990. Diretor e produtor de vários longas de êxito, como “Latitute Zero” (2001), “Cabra Cega” (2004), “A Comédia Divina” (2018) e “Estamos Juntos” (2011), entre outros, ele era dono da produtora audiovisual Olhar Imaginário.
No Brasil, quando estudante secundário, Toni cursou o Ginásio Estadual Vocacional Oswaldo Aranha, em São Paulo, que compunha uma rede de escolas experimentais mantida pela pedagoga Maria Nilde Mascelani e extinta pela ditadura militar. Em 2020, Toni voltou ao tema das escolas públicas tolhidas pelo regime autoritário, fazendo um filme sobre o destino dos seis ginásios Vocacionais do estado de São Paulo, que, na década de 1960, foram alvo da ditadura. Maria Nilde Mascellani foi uma importante educadora brasileira, e os colégios que dirigiu tinham uma proposta à frente do seu tempo: fazer o aluno pensar livremente, trabalhar em grupo e desenvolver a sensibilidade artística e as habilidades técnicas. Partindo do olhar pessoal do diretor, que participou dessa experiência escolar, o documentário trouxe depoimentos de vários ex-alunos e ex-professores e contribui para a compreensão sobre a precariedade do ensino público atual e seus desafios para o futuro
Com o longa nacional Cabra Cega, Toni embarcou na história de Tiago e Rosa, dois jovens militantes da luta armada que alimentavam o sonho de uma revolução social no Brasil. Após ser ferido por um tiro, em uma emboscada policial, Tiago precisa se esconder na casa de Pedro, um arquiteto simpatizante da causa. Com o passar do tempo, Tiago passa a ficar preocupado com sua segurança, adotando um comportamento paranoico e questionando se Pedro não seria, na verdade, um traidor.
Em 2020, Toni Venturi dirigiu Cena Inquieta, uma série documental do SescTV que investigou as formações, conceitos e trajetórias de grupos e artistas do teatro brasileiro. Cena Inquieta, com curadoria de Silvana Garcia e direção de Toni, registrou o trabalho, em 26 documentários de 55 minutos cada, dos mais importantes coletivos teatrais de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Recife.
Além de ter feito uma valente defesa da Cinemateca Brasileira em seu momento mais crítico, sob controle e sabotagem do governo de extrema direita de Jair Bolsonaro, e do Cine Belas Artes, sob ameaça de despejo, Venturi (que era então o diretor da Apasci) fez também um cinema preocupado em mudar certos comportamentos arraigados da tradição brasileira. “A avalanche política e as demandas são tantas que o rolo compressor passa sem claquete. Aqui estamos tentando sobreviver à demolição e destruição dos bárbaros. E nossa arma são os filmes”, afirmou, ao FAROFAFÁ.
Com o documentário “Dentro da Minha Pele”, sua mais recente produção, com codireção e pesquisa de Val Gomes, Venturi buscou transmitir “uma mensagem antirracista e um letramento sobre a questão racial do país”, conforme contou. “O setor enfrenta uma guerra deste governo cínico e primitivo, e mesmo vivendo esta grande turbulência, temos boas novas para apresentar”, afirmou, sobre a guerra cultural empreendida pelo governo Bolsonaro.
“Dentro da Minha Pele” foi selecionado para o International Documentary Filmfestival Amsterdam (IDFA) na seção Frontlight. Com participação de artistas como Chico César e Luedji Luna e intelectuais como Sueli Carneiro, Cida Bento e Jessé de Souza, entre outros, “Dentro da Minha Pele” conta as histórias de 9 pessoas, com diferentes tons de pele preta, que apresentam seu cotidiano na cidade de São Paulo e compartilham situações de racismo, dos mais velados aos explícitos, luta e superação. O médico Estefânio Neto, a modelo-performer Rosa Rosa, os estudantes universitários Wellison Freire e Jennifer Andrade da Faculdade Getúlio Vargas, a funcionária pública e ativista trans Neon Cunha, a trabalhadora doméstica Neide de Sousa, a corretora de imóveis branca Marcia Gazza que perdeu o filho adotado negro, assassinado pela Polícia Militar, e um casal que espera um bebê, a professora do ensino público Daniela dos Santos com o garçom Cleber dos Santos.
“Montamos uma equipe de profissionais negros, com raras exceções (sou uma delas), implementamos um serviço de cuidado da saúde emocional (apoio psicológico) para aqueles personagens que confiaram a nós a sua história íntima e vamos compartilhar a receita advinda do licenciamento com 49 pessoas – personagens, artistas, intelectuais e equipe técnica (44 negros e 5 brancos)”, contou Toni.