Ton Bezerra durante a performance
Ton Bezerra durante a performance "Elo de resistência" (2016) em São Luís. Divulgação

“Meu trabalho é uma coisa que está mais ligado a um conceito do que ao material em si. O material é apenas um substrato do poético que vai revelar outras camadas que tem por baixo ou por cima disso tudo. O trabalho é isso, são essas ideias, essas conjunções de ideias, que vão somando com esse olhar que eu tenho, social, político, estético e antiestético da arte, que através do meu corpo, através dessas coisas que eu agrego a ele e vou formando esse conceito”, me responde o artista multimídia Ton Bezerra, sem deixar de alegar sua própria dificuldade em sintetizar seu trabalho, quando lhe indago sobre o que ele vai apresentar ao programa IMS Convida, com que o Instituto Moreira Salles tem contemplado artistas brasileiros no período de isolamento social imposto pela pandemia da covid-19.

O cantor, compositor e artista performático Negro Léo. Foto: divulgação
O cantor, compositor e artista performático Negro Léo. Foto: divulgação

Na segunda etapa do projeto foram selecionados 63 artistas e coletivos de diversas linguagens de todas as regiões do país. Como na primeira etapa, serão destinados 500 mil reais aos artistas convidados, num “programa de solidariedade com a criação artística, concebido para vigorar durante o período ainda imprevisível da quarentena”, conforme texto sobre o programa, no site da instituição. Dois dos selecionados nesta segunda etapa são maranhenses: Ton, que mora em São Luís, e Negro Léo, nascido em Pindaré-Mirim, que mora no Rio de Janeiro. Ton, nome artístico de Nadilton Bezerra, foi encontrado graças à página dele no site do Prêmio Pipa, ao qual ele foi indicado este ano.

Ton Bezerra nasceu em Cedral, município do litoral maranhense, e teve seu primeiro contato com as artes através do pai, pescador e construtor de pequenas embarcações pesqueiras. Em seu currículo constam três salões de arte contemporânea de São Luís (2010, 2011 e 2015), o prêmio Funarte de arte contemporânea (2015/16) e, entre várias outras, a participação na exposição “A Nordeste” (2019), no Sesc 24 de Maio, em São Paulo.

Ele reflete sobre a relação de seu trabalho, o programa IMS Convida e a pandemia que acabou por originá-lo. “Neste trabalho partirei da ideia de relação entre objeto, espaço, sujeito e práticas, algo recorrente já no meu trabalho, no qual utilizo diferentes materiais e mídias numa relação sempre com o meu corpo através de performances. É uma ideia de corpo expandido na arte e da arte, sugerindo outras visualidades, uma espécie de conjunção de energia desses materiais para criar daí narrativas pautadas em críticas políticas e questionamentos que coloquem em xeque o conceito de lugar instituído da arte e até de sua própria natureza. Meu trabalho para o IMS Convida evidencia o isolamento social e problematiza os vários aspectos de isolamento ao qual muitos são historicamente submetidos. Nesta crise sanitária ficou bem evidente que apenas uma pequena parcela da sociedade tem o privilégio de se isolar da pandemia, enquanto a grande maioria sempre viveu isolada socialmente, sem moradia, saúde, educação e sem garantia alguma de seus direitos, sem ter sequer o mínimo para viver. No trabalho falo também do isolamento geográfico, que é mais um dado histórico no qual eu estou também inserido como artista. Sou um artista descentralizado, ou seja, fora do eixo do circuito da arte, o que é um outro tipo de isolamento que evidenciarei”, comenta.

Desejo de lacrar. Capa. Reprodução
Desejo de lacrar. Capa. Reprodução

Negro Léo acaba de disponibilizar nas plataformas de streaming seu novo disco, “Desejo de lacrar” (ybmusic, 2020), o nono lançamento de sua carreira. No álbum ele é acompanhado por Fábio Sá (baixo e arranjos de cordas), Chicão (piano, synth, órgão e assobio) e Sérgio Machado (Plim) (bateria, percussão, programação, synth, samplers e arranjos de cordas). Em determinadas passagens, a sonoridade de “Desejo de lacrar” lembra o clássico quarentão “Clara Crocodilo” (1980), de Arrigo Barnabé – a faixa “Esplanada” evoca o Milton Nascimento da fase em que era acompanhado pelo Som Imaginário.

Ele ainda não sabe o que vai desenvolver no âmbito do programa. A curadoria chegou a ele através da direção de fotografia do IMS, graças às atividades performáticas visualizadas em seu instagram (@desejodelacrar). “Ou seja, eu não fui convidado pela música”, resume, bem humorado.

Os trabalhos desenvolvidos pelos artistas no programa IMS Convida estão sendo disponibilizados ao público no site e redes sociais do Instituto Moreira Salles a partir deste mês de julho.

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