Em 2007, o pequeno Journal des Plages propôs ao cartunista Albert Uderzo a seguinte questão: “Finalmente, 50 anos depois, quem é Asterix?”. A resposta do desenhista: “É você, sou eu e é o mundo todo. Nós acreditamos por um momento que ele representava o pequeno francês, mas ultrapassou largamente os limites da França. Porque, se você observa os alemães, verá que Asterix é alemão. Esse é o fenômeno, que Asterix tenha se tornado universal mesmo que isso não tenha sido previsto para ele”, ponderou o autor.

Asterix e Obelix, personagens criados por Uderzo e René Goscinny (1926-1977, roteirista), celebram uma era de opulência da solidariedade e de despreocupação selvagem para com a autoridade constituída. São guerreiros da desobediência civil, uma prerrogativa da cidadania que os brasileiros esqueceram tão profundamente. Vivem num paraíso original, numa revolucionária (porque “primitiva”) existência comunitária. Brigam muito entre si, mas com ternura, sem o rancor da nossa era de milicianos, e tudo sempre termina em banquete, javalis e vinho em quantidade dinossáurica – o banquete de aldeões é centrado numa rumorosa discordância existencial, numa barbárie convidativa, periférica.

Herói desajustado e anarquista, Asterix, o grande personagem criado por Uderzo e René Goscinny em 1959, desarma espíritos seja em bancos de espera de ferroviárias ou nos grandes gabinetes decisórios. Albert Uderzo, morto hoje aos 92 anos, de ataque cardíaco, confirmou certa vez uma lenda que corria sobre o herói, que o ligava ao famoso comandante francês Charles de Gaulle: “Fomos convidados, eu e René, para uma estreia no Olympia de Paris. François Missoffe, um antigo ministro do general De Gaulle, descia as escadas para se juntar no foyer aos colegas. Ele viu René, o abordou e contou a ele: ‘Escute, aconteceu algo extraordinário no último encontro do Conselho de Ministros. De Gaulle começou a nos chamar um por um pelo nome dos personagens da sua vila gaulesa. E todo mundo se reconhecia! Abraracourcix? Presente! Assurancetourix? Presente…””

Uderzo sobreviveu a quase todas as ondas de modernização dos quadrinhos escorado nos gauleses que inventou, os irredutíveis camponeses que resistem sem o saber
ao inimigo expansionista e autoritário da humanidade – Asterix pode encarnar em qualquer uma metáfora de resistência, especialmente da produção artesanal contra a invasão massiva. São pequenos, mas descomunalmente importantes para gerações de leitores. Uderzo, esse louco gaulês! Vá com Deus!

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