FAROFAFÁ reproduz abaixo artigo assinado por Paula Lavigne, diretora do grupo Procure Saber, publicado originalmente na edição de 5 de outubro do jornal carioca O Globo. Acreditamos ser a transcrição importante, uma vez que revela alguns dos interesses do grupo articulado pela elite da MPB na questão da autorização prévia de biografias, e também pelo que o texto diz, às vezes sem querer dizer, sobre agendas ocultas. Os grifos são nossos.

 

Agenda oculta

“Muito se tem escrito sobre a necessidade da autorização das pessoas biografadas para a publicação de obras sobre suas vidas. Infelizmente, a maior parte do que se diz não reflete os reais objetivos desse movimento.

“No centro da questão, estão os artigos 20 e 21 do Código Civil. Segundo o artigo 20, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra ou a publicação, a exposição e a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas se atingirem a sua honra, boa fama ou respeitabilidade, ou se forem usadas para fins comerciais. Já o artigo 21 estabelece que ‘a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma’.

“Sendo assim, o biografado ou seus sucessores, caso ele tenha falecido, tem direito de não permitir a publicação de biografias e o uso de imagens se violarem a honra e a dignidade do sujeito da biografia, ou se a obra for para uso comercial. Isso quer dizer que as biografias que se destinem a pesquisa, sem objetivo comercial, não são proibidas pelo artigo 20 acima citado e que a vida privada de uma pessoa não pode ser violada.

“O argumento de que esses artigos do Código Civil se chocam com o direito fundamental à informação, às liberdades de expressão e de pensamento, além de constituir um ato de censura, não se sustenta. Expor a vida íntima e privada de homens e mulheres públicos, os pedaços de vida que essas pessoas têm e que são absolutamente privados, não serve aos nobres objetivos da instrução e do conhecimento, e sim para alimentar uma das mais conhecidas fraquezas do ser humano: a fofoca. Detalhes picantes, dolorosos ou indiscretos da vida de alguém ‘vendem’ biografias. Cortar a ‘liberdade’ dos editores de usar esse recurso é uma ameaça às vendas.

“A grita do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), representado pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) na ADI 4815, não visa proteger o direito de informação e liberdade de expressão, como quer fazer crer. O problema está ali, no finzinho do art. 20 do Código Civil, em duas palavrinhas: “uso comercial”, e no art. 21 como um todo. A proibição de que se possa comercializar a vida dos outros, sem sua autorização, é a motivação do SNEL, que reúne a Casa da Palavra, a Ediouro, o Grupo Editorial Record, Editora Globo, Editora Intrínseca, e outras editoras que publicam biografias.

“Além do setor editorial, outro segmento da produção cultural seria o grande beneficiário: o do audiovisual. Aqueles que produzem filmes, novelas, documentários e minisséries, também querem essa ‘liberdade’. Só ao biografado se reserva o ônus dessa discussão, em um país em que o dano moral não é levado a sério e a justiça é lenta e cara.

“Longe do que vem sendo divulgado, a Associação Procure Saber, entidade representativa de artistas que buscam estudar, entender e esclarecer assuntos de interesse da classe artística e da população em geral, não defende a censura ou a diminuição da liberdade de informação e pensamento; o que a Procure Saber deseja é apresentar uma alternativa que atenda aos escritores mas não crie uma situação de exploração da obra e da vida alheia sem a remuneração correspondente e sem que a vida privada e a intimidade do biografado sejam violados.

“Nesse sentido, a Procure Saber pretende apresentar proposta de alteração desses dois dispositivos do Código Civil, de forma a acomodar interesses comerciais de todas as partes — escritores, editoras, biografados e seus herdeiros (*) —, cuidando de preservar a intimidade e a vida privada do biografado, que não podem ser subjugados para proteger outros direitos que, de fato, não estão sendo prejudicados ou violados”.

 

(*) FAROFAFÁ estranha o fato de a Procure Saber suprimir o público leitor e os cidadãos em geral entre “todas as partes” dotadas de interesses (“comerciais”, diz a diretora) a ser contempladas pelos artigos 20 e 21 do Código Civil.

 

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