Transfeministas

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Tássia Reis - foto Larissa Isis
A afirmação feminina é a pauta do festival independente Sêla, que acontece entre os dias 1 e 5 de fevereiro, em São Paulo, em palcos do Centro Cultural São Paulo, da Breve e d’O Lourdes, com uma programação de shows, discotecagens e debates. Diversidade, inclusive de pontos de vista, parece ser mote caro à curadoria da também cantora e compositora (e integrante do elenco) que tem como uma das atrações principais a banda As Bahias e a Cozinha Mineira, integrada por duas transexuais, Assucena Assucena Raquel Virgínia.

“A Sêla é transfeminista”, explica Camila, em entrevista a FAROFAFÁ (leia mais na edição 937 da revista CartaCapital). Mais abaixo, segue a programação completa do festival. “Podemos ser quem quisermos ser.  É imprescindível que as mulheres trans estejam no movimento feminista”, afirma Camila, num raciocínio que, ainda mais amplificado, soaria bonito nas bocas dos homens, de gays a heterossexuais, em toda a imensa diversidade de tipos que compõem esse espectro maleável e instável.

Camila Garófalo
Camila Garófalo

Pedro Alexandre Sanches: Qual a ideia geral do festival Sêla? Por que é importante a realização de um festival com essas características?

Camila Garófalo: Sêla é uma aliança entre mulheres da música. É o fortalecimento de uma rede feminina que produz em todas as esferas do mercado fonográfico. É o seio e o anseio. É o colocar-se no lugar da outra. É o fazer juntas, tocar juntas. É desmistificar a ideia de competição e criar palcos compartilháveis. O festival Sêla é a primeira ação desse movimento, feito por mulheres por mais mulheres. Num cenário predominantemente masculino da música, as mulheres são subestimadas e desacreditadas em suas funções e capacidades o tempo todo. É muito, muito importante lutar contra isso, reverberar nosso protagonismo e cantar nossas urgências.

PAS: Pode falar um pouco sobre a curadoria do evento, tanto sobre as artistas selecionadas como sobre as debatedoras?

avatars-000130126160-bk2z23-t500x500CG: Há uma diversidade de motivos que explicam o line-up. A começar pelas artistas dos shows de abertura, que são mulheres com as quais eu já troquei experiências, seja no palco, seja na vida. Com a Sara Não Tem Nome compartilho dos mesmos sentimentos ao compor. Com Larissa Baq produzi o Sonora – Ciclo Internacional de Compositoras, em São Paulo. Com Natália Matos dividi o mês das mulheres no Prata da Casa do Sesc Pompeia. Com a Sandyalê tive uma experiência surreal de encontro de almas. Com a Marina Melo subi no palco do CCSP e arrepiei ao ouvi-la com a Mel Duarte. São mulheres que lutam pelo seu espaço na música independente e dedicam toda sua energia nessa busca.

Tássia Reis - foto Larissa Isis
Tássia Reis – foto Larissa Isis

Já as cantoras convidadas, Tiê, Tássia Reis e As Bahias e a Cozinha Mineira, foi por considerá-las excepcionais dentro do objetivo que se propõem na música. A Tássia, por encontrar voz e força no meio machista do rap nacional. A Tiê, por ser absolutamente empreendedora e tomar decisões sobre sua própria carreira. E As Bahias e a Cozinha Mineira, por simplesmente lacrar o ano de 2016.

Trouxe a Luana Hansen porque sou fã dessa mulher há muito tempo. Ela é preta, lésbica e futurista, faz rap feminista de qualidade. A Anna Tréa, por ser uma instrumentista monstruosa e por provar que mulher sabe tocar guitarra tão bem quanto homem. Quanto às cantoras da mesa de debate do dia 1 eu também troquei aventuras. Já aconselhei muito a Silvia Sant’Anna sobre carreira, frequento o Teatro de Bolso do IV Mundo da Malu, que faz parte da dupla Manallu, falei sobre o protagonismo da mulher na música com a Amanda na mesa de debates da festa Demandas Lôca do Play da Cris Rangel, que indicou a Julia Baldi.

Já a Nina Oliveira participou do meu último clipe, “Camarim” (acima), junto com outras grandes cantoras, de onde nasceu a Sêla. Pela Érica eu já nutria admiração, e ela convidou a Sanni (Alemanha) e a Amanda Mussi para discotecar no dia 2. Todas nós estamos interligadas de alguma forma.

PAS: As Bahias e a Cozinha Mineira, destacadas no material de divulgação do Sêla, não nasceram mulheres, naqueles termos binários antigos que ainda vigoram em grande parcela da nossa sociedade. Como contextualizá-las, e à transexualidade, no conceito desse festival de afirmação feminina?

CG: A mulher não é um corpo, mas a sociedade insiste em nos negar o sujeito. O que define ser mulher não é o gênero e sim a opressão ao feminino. Tanto para mulheres cis, que lutam até hoje por seus direitos políticos (e para mantê-los), quanto para mulheres trans, que primeiro lutam para serem reconhecidas mulher para depois lutar por seus direitos políticos. A sociedade nos controla, mas se esquece que existem seres incontroláveis. Nosso sujeito é subjetivo, recebe o mundo de forma única. Por isso, podemos ser quem quisermos ser.  É imprescindível que as mulheres trans estejam no movimento feminista. As Bahias e a Cozinha Mineira representa a voz e o espelho que se deseja para o feminismo. A SÊLA é transfeminista.

Assucena Assucena e Raquel Virgínia, d'As Bahias e a Cozinha Mineira
Assucena Assucena e Raquel Virgínia, d’As Bahias e a Cozinha Mineira

 

Programação completa

 

1 de fevereiro, no Breve (rua Clélia, 470)

19h

Bate-papo: “Paradigmas da mulher na música” com artistas da cena independente da música: Drika Oliveira, Manallu, Silvia Sant’Anna, Nina Oliveira e Amanda

22h

Show: Anna Tréa

23h30

DJ set: Julia Baldi

 

2 de fevereiro, n’O Lourdes (rua da Consolação, 247, loja 8)

20h

DJ set: Luana Hansen, Sanni e Amanda Mussi

 

3 de fevereiro, no CCSP (rua Vergueiro, 1.000)

19h

Abertura: LaBaq, Marina Melo e Mel Duarte

Show principal: Tássia Reis

 

 

4 de fevereiro, no CCSP

19h

Abertura: Sara Não Tem Nome e Camila Garófalo

Show principal: As Bahias e a Cozinha Mineira

 

5 de fevereiro, no CCSP

18h

Abertura: Natália Matos e Sandyalê

Show principal: Tiê

 

 

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