A controvérsia a respeito da saída do ministério da Cultura de Marcelo Calero, O Breve
O ministro da Cultura do governo em exercício, Marcelo Calero, teria se demitido na tarde desta sexta, após somente 6 meses no cargo. Há controvérsia: ele teve audiências, na quarta e na quinta, com o senador Romero Jucá, líder do governo no Senado, e com Eliseu Padilha, Chefe da Casa Civil. Ambos externaram reclamações do governo com sua performance. Finalmente, foi chamado para conversar com o próprio Temer ontem, que chamou sua atenção para o fato de que parlamentares da base o procuraram com queixas dele (desmarcava compromissos sem justificativas e agia com arrogância, teriam dito alguns deles ao chefe). Convicto de que seria demitido, pode ter inventado uma saída honrosa, demitindo-se antes.
Há outra versão: a saída de Calero seria sinal de que o PSDB estaria abandonando progressivamente o governo do golpe, que já faz água, para assumir em um sonhado “mandato-tampão” no ano que vem. Essa tese foi defendida por Chico Graziano em artigo na Folha de S.Paulo recentemente. Ou saiu para livrar-se de uma calamidade iminente. Calero era oriundo do PSDB, embora tivesse escondido essa gênese. Mas sua saída não muda nada: a ausência preenche uma lacuna, como diz o velho ditado; não havia de fato uma política cultural sendo esboçada.
Ocorre que Calero vinha se esmerando em descobrir que a realidade era mais imperiosa do que as aspirações dos golpistas na área cultural. Quase tudo que dizia era desmentido em seguida pelos fatos. Por exemplo: em 26 de junho, após reunião com dirigentes de associações integrantes do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais (Ecad), Calero havia dito o seguinte: “Temos que buscar uma política de direito autoral mais conciliatória. Não poderia ser arrogante e achar autoritariamente que o Ministério tem que impor uma determinada decisão. Temos que escutar os vários lados e, a partir disso, trilhar o caminho do meio”. Ato contínuo, o STF decidiu (por 8 votos a 1) que a Lei do Direito Autoral decidida por CPI mista era legítima (Lei 12.853/2013), não tinha nada de inconstitucional ou autoritária. O STF derrubou a demanda do Ecad, que era abraçada por Calero.
Calero também tentou boicotar a CPI da Lei Rouanet, que é um front casuístico da bancada da bala e dos evangélicos, também da base do governo em exercício. Teve de curvar-se à realidade: os vícios da legislação, já controlados pela polícia e pelo TCU, nunca justificaram uma Comissão Parlamentar de Inquérito, mas a conveniência política sim. Do seu lado, se permanecesse, teria de deslocar durante meses técnicos do Ministério da Cultura (que já são poucos) para atender às exigências de uma comissão sem norte e sem propósito a não ser o revanchismo político. Corria o risco de uma paralisia involuntaria.
Calero tinha se desgastado também com setores influentes da música e do audiovisual, não tinha como progredir em ações nessas áreas, que são vitais no entrechoque da cultura. Por outro lado, tinha construído alianças entre as forças economicamente mais poderosas do espectro cultural, o que lhe tinha garantido até uma certa estabilidade no cargo. Levou para seu governo nomes como o do ex-secretário de Cultura de São Paulo, Marcelo Araújo, homem forte da área de museus. Essa estrutura deve ruir com Roberto Freire, que tem seu próprio exército de mão de obra disponível para empregar.
Freire, que foi anunciado como substituto, é um mastim ideológico. Nunca teve estofo nem para assumir cargos de segundo escalão nas gestões que seu partido apoiou, como as dos governos paulistas. Apesar do voluntarismo, também não conseguiu cargos em estatais e outros cabides, apesar de sua dedicação canina. É a primeira vez que é premiado, e certamente não por suas qualidades na gestão cultural.
A saída de Calero tem um mérito indireto: ela escancara o início do isolamento de um governo ilegítimo que acumula indicadores negativos nas áreas econômica e social, e não demonstra capacidade de articulação parlamentar. Também se somam a essa onda as prisões de Sérgio Cabral e Anthony Garotinho, no Rio, capturas que esboçam um período negro para o partido no poder, o PMDB. Soa a debandada. Essa semana, o governo já cedeu aos Estados na questão da partilha do repatriamento de recursos. Vai continuar cedendo, é sua única alternativa, até que o vale-tudo extremo revele todas as vigas que os cupins já devoraram da forma como estão de fato hoje.
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