O poeta Celso Borges. Divulgação
O poeta Celso Borges. Divulgação

Chico Maranhão não toma mais banho/ na praia da Ponta d’Areia./ Da última vez pegou uma coceira nas pernas/ que virou ferida./ Nunca cicatrizou”, escreve o poeta Celso Borges no poema de número 36 de seu livro mais recente, “Pequenos poemas viúvos”, lançado ano passado de forma online.

Outro ludovicense ilustre homenageado pelo poeta nas páginas do “livro azul” é Nauro Machado, no poema de número 84: “Nauro Machado velado sem barba/ na Academia Maranhense de Letras:/ blasfemam as fanfarras de súbito mudas/ nos ouvidos marcando a pancada da terra./ Esta é Troia!, o vigésimo século em Troia”.

Em ambos os poemas destacados, Celso Borges dialoga com a vida e a obra dos homenageados, de quem é admirador confesso desde tempos imemoriais. Mas “Pequenos poemas viúvos” – com seus poemas vivíssimos – não é um livro de poemas sobre maranhenses ilustres, embora outros figurem em suas páginas, como os poetas Bandeira Tribuzi, Ferreira Gullar e Reuben.

No tecido formado pelos 90 poemas curtos da obra, Celso Borges alinhava vasto conhecimento de artes, memória, homenagens e bom humor, relendo, criando, reinventando ou subvertendo acontecimentos.

Alguns poemas dialogam diretamente com Leminski, outros com Oswald de Andrade e tudo não deixa de ser também um banquete antropofágico: o autor se apropria de obras e histórias alheias para cerzir sua poesia, sempre de alta qualidade, sempre embalada em belo projeto gráfico, um padrão inescapável de sua produção de ao menos os últimos 20 anos, desde que o também letrista de música popular iniciou suas interessantes experiências de aproximar poesia e música em livros-discos (“XXI”, de 2000, “Música”, de 2006, e “Belle epoque”, de 2010).

A viuvez do título decorre do início da escrita dos poemas que figuram na obra. A princípio o poeta passou “a imaginar, criar e inventar liricamente situações existenciais, a maioria dentro de um corpo de dor e perda, vividas por personagens da literatura e da música”, a que se somaram outros, resultando no volume.

Os poemas são vivos e escritos com uma delicadeza capaz de atenuar a brutalidade e a precocidade de certas perdas: “a poesia é maior que a morte”, dizem ao mesmo tempo o último poema do volume e o texto de apresentação, assinado pelo autor – o prefácio é do poeta Samarone Marinho e o livro tem ilustrações de estudantes do Ifma, sob orientação do professor Eduardo Cordeiro, com quem Celso Borges já havia trabalhado em “O futuro tem o coração antigo” (2013).

Num poema estampável em camisetas, o poeta afirma que “são muito poucos os que ainda querem ser rebeldes”, e isso diz muito do autor, inquieto e instigante, que não poupa a si, a Deus nem a ninguém, quando o assunto é dar o seu recado: em poesia tudo é possível, mesmo quando quase tudo já foi feito.

Pequenos poemas viúvos. Capa. Reprodução
Pequenos poemas viúvos. Capa. Reprodução
Serviço: “Pequenos poemas viúvos” (Olho d’Água Edições, 2020), de Celso Borges, terá lançamento presencial neste sábado (23), a partir das 17h30, nos jardins do Museu Histórico e Artístico do Maranhão (MHAM, Rua do Sol, 302, Centro), dentro da programação do sarau RicoChoro ComVida.
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