Nelson Triunfo, um dos pais do hip hop nacional - Fotos Juvenal Pereira
Nelson Triunfo, um dos pais do hip hop nacional – Fotos Juvenal Pereira

Para ver o show Discotecagem Nelson Triunfo e Sabotage, no Sesc Campo Limpo, zona sul de São Paulo, fui com o escritor negro Paulo Rafael. Pegamos um busão na Pompeia, zona oeste, e partimos rumo à estação de trem Cidade Universitária. De lá seguimos até Santo Amaro e fizemos a baldeação para o Campo Limpo na linha Lilás do metrô. Pouco mais de 20 quilômetros de distância e nenhum estresse ao volante. Dois quarteirões depois profissionais negros afinavam o som em uma tenda para o evento Sou Hip Hop. Como eu e Paulo Rafael, veio Irineu, torneiro mecânico, de Ermelino Matarazzo, na zona leste. Queria ver o show e trabalhar o CD de seu grupo “Diário da Vida do Cotidiano”. O torneiro mecânico é vocalista e letrista.

O Sou Hip Hop faz parte de uma programação especial do Sesc para homenagear obras que são referências do hip hop nacional e produções da cena contemporânea. Neste dia, os biógrafos Gilberto Yoshinaga e Toni C., que escreveram “Nelson Triunfo, do sertão ao hip hop” e “Sabotage, um bom lugar”, participam de uma roda de conversa antes do show. Sabotage já dizia que o rap é compromisso. E mobilizar, debater e conscientizar sempre fez parte desse compromisso.

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A conversa gira na roda e Nelson Triunfo, com sua conhecida energia, fala alto que não é esta mídia que eles querem. “Chega de Datena!” Um dos precursores do hip hop no Brasil, Triunfo perdeu a conta de quantas vezes foi preso. Às vezes, até por seu enorme cabelo afro. Agora, aos 60 anos, os dreadlocks estão guardados num gorro com as cores da Jamaica. Alguém do público quer saber o que ele achou da passeata dos que querem o “Fora Dilma”, foi direto ao ponto: “O PT não está lá estas coisas, mas o voto das urnas tem que ser respeitado.”

Triunfo é um sociólogo e um griot (termo do vocabulário franco-africano para designar o narrador, cantor, cronista e genealogista que, pela tradição oral, transmite a história de personagens). “Não sou um sociólogo formado na universidade. Gosto de observar e por ter vivido a vida que vivi e também por já ter feito palestras na Alemanha e França sobre o hip hop. Então sou um professor!” Alguém discorda?

Quem estava ali presente ouviu uma aula de história contemporânea, sobretudo de um Brasil que nem sempre é retratado nos livros escolares. Triunfo explicou, fazendo um longo rap-repente, a relação da embolada com o hip hop. Uma origem que remonta a Jackson do Pandeiro, cantor e compositor de forró e samba, o autor de “Chiclete com Banana” (“Eu só boto bi-bop no meu samba”).

Uma professora que mora na periferia contribui nesse debate com um exemplo próprio. Certa vez, teve dificuldades de mostrar que o hip hop é cultura. A diretora de sua escola chegou a tirar a aparelhagem de som e ela levou o dela para casa. As crianças parecem adorar estar no Sesc Campo Limpo, ouvindo conversa de “gente grande”.
Eu, Juvenal Pereira, me apresentei como membro do #JornalistasLivres e que estava ali para fazer uma reportagem. Expliquei que não tínhamos patrões e queremos mostrar um jornalismo na horizontalidade (não visto como uma panorâmica), mas “ali ao níivel do chão”. Fui aplaudido. Yoshinaga e Toni C., os biógrafos dos homenageados, falaram de suas obras, da genialidade dos personagens perfilados e das dificuldades em financiar a produção literária no Brasil.

A conversa estava boa, mas era hora de começar a música. A tenda de lona fica pequena para o público. A discotecagem do baile foi comandada por KL Jay (Racionais MC’s) com participações especiais de Rappin Hood e Sandrão RZO. A plateia se envolve no som. Todos. Sonia Marice, moradora do Campo Limpo, era uma delas. Aos 61 anos, não economizava nos elogios: “É um bem estar, traz alegria pra gente.”

Rap é compromisso, sim.

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