para concluir o ciclo lipovetsky, eu ainda gostaria de mencionar um o que ele diz a respeito da mídia. é outro caso em que a gente vê o cara dizendo, 14 anos atrás, o que só agora nós brasileiros começamos a nos perguntar, a respeito da nossa mídia. começamos a pensar nisso, de modo muito rudimentar, só agora, quando até hollywood já começa a fazê-lo.
[“boa-noite, e boa-sorte”, do galã george clooney, indicado a um punhado de oscars, fala sobre isso em ambiente essencialmente jornalístico, apesar de fazê-lo ainda enfronhado num punhado de mistificações românticas e de maniqueísmos preto-no-branco, ou branco-no-preto. mas faz, e parece arremeter-se não só contra o velho senador mccarthy combatido no enredo, mas mais ainda contra o governo bush, contra a gana censora do governo bush, contra a apatia a que a mídia norte-americana se auto-arremessa diante de bush. até em hollywood?, será mais um muro de berlim que começa a ruir? alô, “brokeback mountain”!]
pois bem, gilles lipovetsky parece falar mais da mídia televisiva, mas eu gostaria de pedir uma abrangência maior a isso aí – cada vez me convenço mais que a mídia televisiva é igual à de rádio, jornal, revista, assessoria de imprensa, gibi, rave, dança, boate, teatro, cinema (qualquer prazer não satisfaz?), internet, blog, orkut, o que quer que seja. na globopop do povão e na globocabo dos riquinhos, indistintamente.
[afora a demissão do ariano bóris casoy, você já viu a inclusão social – forçada? – que vem sendo operada pela “evangélica” rede record? já viu os vários negros que compõem o elenco da novela que vem desbancando os índices até mesmo do “jornal nacional”? sabia que a esposa do surreal alexandre raposo, atual presidente da record, é negra? (eu estava lá na entrega do troféu raça negra na sala são paulo, e vi o raposo recebendo distinção de mérito, orgulhoso e emocionado por estar de braços dados com sua esposa negra.) será por isso que a record vem ganhando audiência em cima da globo, em cima de um “jornal nacional” que fala da vitória da unidos de vila isabel omitindo o – potencialmente escandaloso – financiamento da escola pelo governo meio indígena do venezuelano hugo chávez?]
e a pergunta crucial é: até quando parte preponderante (e mais poderosa) da mídia seguirá adotando preceitos largamente moralistas, fundamentos essencialmente fundamentalistas (às avessas, ao contário, à penumbra), elementos prioritariamente fundados no grau zero de autocrítica e autoconhecimento?
[tudo que vem sublinhado abaixo é para destacar o deprimente e o horrível inerentes às palavras destacas, ok?]
fala, lipovetsky:
“doravante, a mídia está no centro da crítica social. considera-se que degrada o ideal democrático e transforma as instituições políticas num show sensacionalista; põe em destaque os episódios secundários, invade a esfera da vida privada, faz e desfaz arbitrariamente reputações, torna as mentes superficiais, divulga indiscriminadamente o que aparecer. destituída de critério moral, a mídia tem um só objetivo: ficar no centro das atenções; vender sua ‘mercadoria‘; aumentar seus índices de audiência, valendo-se para isso de quaisquer recursos. (…) no atual contexto dos programas ao vivo, da superabundância informativa, do espetáculo informatizado, recrudesce o apelo em prol de um maior senso de responsabilidade por parte da mídia, de um comedimento razoável à liberdade de informação, da moralização do ofício de jornalista.”
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[percebe que (falso) moralismo implica, quase necessariamente, em amoralidade (desmoralização?)? percebe que é santo do pau oco com a viola cheia de cupins aquele que proclama em alto e bom som as amoralidades alheias, mas não tem olhos nem ouvidos para as suas próprias? percebe que esse (o do – falso – moralismo) é o supra-sumo da ignorância e do obscurantismo praticados em prejuízo próprio e alheio?]
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“o dado novo é que tais críticas não provêm unicamente do público telespectador ou dos políticos e intelectuais; partem agora dos próprios jornalistas, que vão exprimindo o desejo de uma maior atenção à deontologia da imprensa, de uma redefinição dos princípios de responsabilidade. surgem mesas-redondas, trabalhos de divulgação, artigos de jornalistas invectivando a ‘ditadura dos índices de audiência‘, ‘o oportunismo interesseiro‘ da tv, o sensacionalismo, as novas formas de corrupção dos jornalistas, a subserviência da imprensa à publicidade paga, o atabalhoamento na coleta de dados, o desrespeito à privacidade, o ‘narcisismo do quarto poder‘.”
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[atenção para o que vem abaixo! uma mídia que fosse adulta precisaria realmente adotar volta e meia a posição de “vítima”? quem é que, na sociedade moralista, precisa se fazer de “vítima”? os mendigos esmolambentos das esquinas? a mídia? e a sociedade pós-moralista, seria quiçá aquela em que os indivíduos, um a um, fizessem questão absoluta de não se autovitimizarem? oxalá, alá!]
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“diante dos ataques recebidos, inicialmente a mídia se coloca na posição de vítima, como joguete das autoridades que mentem ou distorcem a realidade dos fatos, impossibilitando-a de executar eficientemente seu trabalho. ciosa de resguardar o supremo direito da informação, é mais propensa a procurar uma justificativa para os seus erros do que admitir sua própria responsabilidade no fracasso da informação. contudo, hoje são muitos os jornalistas que já não se satisfazem em jogar a culpa em terceiros, mas passaram a admitir a responsabilidade específica da imprensa; por isso lutam por uma reafirmação dos deveres da imprensa, por uma moralização da profissão em si mesma. numa palavra, a ética está em evidência.”
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[sim, dr. lipovetsky, admitamos responsabilidades específicas que são nossas e de mais ninguém! basta de atirarmos a culpa em terceiros como quem entra no quintal do vizinho e planta uma flor (alô, amado roberto carlos!)! e, sim, abaixo as ditaduras! as ditaduras da mídia, também, abaixo! pimenta nos olhos da mídia, vai um pouquinho? a ética está em evidência?]