ainda somos inúteis?

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e o disco mais genial que tenho ouvido nestes dias é “ainda somos inúteis!”, um tributo ao ultraje a rigor arquitetado pela migué records, de santa catarina, e pela monstro discos, de goiás.

discordo da exclamação do título. eu preferiria que perguntássemos: “ainda somos inúteis?” ainda somos inúteis? na minha opinião, a resposta é “não! não somos!”, mas, ok, isso é meramente subjetivo.

talvez seja o caso pensar se se fundaria na dupla “úteis”/”inúteis” qualquer tipo de discussão produtiva para os dias de hoje.

porque útil é quem serve a alguém, né? e inútil é quem não consegue servir a ninguém, não é?

se for, basta. (inocente) útil é o capeta. inútil é o raio que os parta.

mas, então, mesmo assim. “ainda somos inúteis!” soa genial, se não por outra razão, pelo simples fato de peitar a ousadia de colocar dezenas de grupos jovens e bacaníssimos de rock’n’roll brasileiro para prestar uma homenagem em bom português a um grupo de suposta segunda divisão (o ultraje a rigor) de uma geração de suposta terceira divisão (a do pop-rock dos anos 80).

(enquanto isso, a banda homenageada em si está lançando um “acústico mtv”… tudo bem, nem o ultraje em pessoa consegue ser ultrajante o tempo inteiro, não é mesmo?)

enquanto isso, mais divertido ficar com o tributo, para a gente lembrar que “ciúme” (“eu quero levar uma vida moderninha/ deixar minha menina sair sozinha/ não ser machão e nem bancar o possessivo/ ser mais seguro e não ser tão impulsivo/ mas… eu me mordo de ciúme!”) já vai ficando datado, que “inútil” (“a gente não sabemos escolher presidente”) já datou e que, crianças do brasil, nós temos um passado de que podemos nos orgulhar, sim!

por que “a gente não sabemos escolher presidente” já datou? porque hoje em dia estamos descobrindo, à custa de muita dor (& prazer), que em vez de ficar no nhenhenhém eterno de “meu governante me decepcionou” talvez seja hora de trocarmos a pergunta sonsa “quem me governa?” pela afirmação audaz “eu me governo”.

o ultraje a rigor nunca apontou solução nenhuma. mas talvez, fazendo parte do problema e do percurso, o ultraje sem nenhum rigor já fosse, sendo somente o que era, um pedacinho pequenino de solução.

é por essas & por outras que, hoje, veteranos srs. ultrajantes podem dizer em coro com seus pupilos: “ouçam os clássicos, crianças”.

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Editor de FAROFAFÁ, jornalista e crítico musical desde 1995, autor de "Tropicalismo - Decadência Bonita do Samba" (Boitempo, 2000) e "Como Dois e Dois São Cinco - Roberto Carlos (& Erasmo & Wanderléa)" (Boitempo, 2004)

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