feliz que fiquei com o resultado da reportagem sobre a faculdade zumbi dos palmares (fazp), ontem lá fui eu, todo serelepe, assistir, “enquanto jornalista”, à festa de 13 de maio da primeira escola superior preponderantemente negra do brasil (e da américa latina, segundo contam orgulhosos os próprios fazps, do reitor ao porteiro).

e, olha, vou te contar, lá é onde tudo se mistura, literalmente.

lá eu vi de perto, pela primeira vez, o controverso severino cavalcante. lá eu vi de perto, e emocionado, mãe nitinha, a mãe de santo que lula não conseguiu embarcar para os funerais do papa – mas que a fazp conseguiu arrastar a uma cerimônia de louvor à abolição da escravatura e à entrega de uma comenda de ordem do mérito cívico afrobrasileiro (que ela, o severino & outros vários receberam).

o espectro político era assustador, uma mistura daquelas: o deputado machista do pp severino cavalcante, a ministra feminista do pt nilcéa freire (da secretaria especial de políticas para as mulheres), o militante negro e secretário recém-empossado da justiça e defesa da cidadania do psdb paulista hédio silva, o cônsul do uruguai, o cônsul da áfrica do sul, o cônsul dos estados unidos (!!!)…

o espectro religioso, então, era uma loucura: mãe nitinha e outras mães de santo, o padre preto da paróquia da acheropita (um padre negro em pleno reduto italiano do bexiga!), evangélicos e/ou ateus que, da platéia, não quiseram se levantar ante a oração católica… o coral negro que emoldurava a membrana de chatice do ato oficial alegorizava em si a diversidade, profanando hinos gospel, cantos rituais africanos, “oh happy day” e, meu deus do céu!, uma versão rebelde trespassada do hino nacional brasileiro, que a partir de então parecia soar, tudo ao mesmo tempo, soul, funk, samba, “aquarela do brasil”.

o telão expunha os feitos anteriores da fazp e de sua mantenedora, a ong afrobras (você já ouviu esses nomes antes? já viu essa gente ganhando papel de protagonista na grande imprensa?). e, vou dizer, eles são exuberantes: imagens da festa de gala para a entrega do troféu raça negra, no teatro municipal de são paulo… clipes sobre orgulho protagonizados por alexandre pires, netinho de paula, taís araújo, nico puig (?!), jair oliveira… beth carvalho aos prantos diante de uma platéia negra no teatro municipal… etc. etc. etc.

severino, esse (in)compreendido, parecia cansado, extenuado. só cresceu e ergueu a voz quando, em meio à confusão mental habitual, discursou dizendo-se um soldado da causa negra, um irmão de luta por conta do preconceito e da discriminação que ele também sofre, por ser nordestino e porque “esses jornalistas de elite não entendem que não tive o direito de freqüentar uma universidade”. em sua confusão mental, severino não entende que o preconceito que existe contra os pretos, os nordestinos e os mal alfabetizados é irmão gêmeo do preconceito que existe contra os homossexuais, as mulheres, as mulheres estupradas, as prostitutas e os deputados (lá, no discurso, ele manifestou explicitamente seu orgulho por ser deputado, o que foi muito bacana).

(se bem que, sei lá, será que convidaram ou vão convidar o severino para a parada gay de 2005? sou capaz de apostar que, se for convidado, ele aparece. porque desconfio que, de dentro de sua imensa confusão mental, severino sabe perfeitamente que todos os diferentes são iguais, e que ele é um deles…)

[por que o severino tem causado tanto escândalo, rendido tanta manchete? porque ele existe? ou porque ele não só existe como faz estardalhaço sobre sua própria existência? porque, vem cá, deve haver um trocentilhão de senadores, deputados, governadores, prefeitos, vereadores e brasileiros parecidíssimos com severino xique-xique, não? como é? esses a gente vai deixando?… a menos que eles resolvam berrar feito bezerros desmamados, como vem fazendo o confuso severino?… invisibilidade carcomida é algo que dói em nossos ouvidos?…]

ei. você viu essas notícias sobre a fazp comemorando os 117 anos da abolição da escravatura na globo, na folha, no estado etc.? pois seus jornalistas também estavam todos lá (alô, minha querida f.m.!), perseguindo as gafes do severino e compondo a fauna & a flora daquela diversidade transbordante.

falando nessas presenças todas, penso numa estranha ausência. onde será que estava ontem a ministra da promoção da igualdade racial, matilde ribeiro? faltou ela naquele convescote chique de carrões oficiais que se enfileiravam, sabe-se lá por conta de quais das ironias da realidade brasileira, naquela rua estreita do centrão velho de são paulo, à beira do lumpesinato da estação da luz, onde se finca a universidade da cidadania zumbi dos palmares.

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