hum, dessa vez “desconcordei” com meu estimado (e carinhosíssimo) nelson motta, no artigo de fim de semana em que ele embarcou nessa de o brasil estar encrencado numa suposta “era da ignorância”, por conta do exemplo-lula. ora, vai, nelsinho, dá uma espiada direito nessa história (dá uma lida, por exemplo, na “carta capital” desta semana, hehehe)… eu vejo justamente o contrário. hoje debatemos reforma universitária, discutimos cotas (e por intermédio de cotas discutimos racismo, discriminação e abismo social), deliberamos sobre as mamatas da privatização indiscriminada no ensino superior… dá uma olhada no que diz rappin’ hood, preto pobre periférico que aos 33 anos voltou à faculdade (estimulado em parte por uma política de cotas), cursa administração para aprender a gerenciar seu próprio selo e arremata tudo isso com um “ele é um exemplo fortíssimo para mim”. “ele” é lula, entendeu? tudo isso acontece sob lula. nada disso aconteceu sob fhc, itamar, coll…
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pois então, querido nelson motta. ao ouvir rappin’ hood estamos falando, como sempre, de nossa gloriosa “black music brasileira”, né? eu não esqueço nem nunca esquecerei que você é de formidável importância na construção de uma “black music nacional”. sei que você comungou com marcos valle, elis, roberto & erasmo o advento de tim maia e de toda essa glória negra num aparentemente imutável país de excluídos fodidos e de incluídos encastelados. não esqueço…, por favor não esqueça…
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ih, paro de conversar com nelson motta, que tem mais gente assistindo. mas falando de nelson motta me lembro de marisa monte. e me lembro de que soube que no século passado marisa monte fez, incógnita e caladinha, uns backing vocals para o disco “vange” (sony, 1991). se não me engano era na faixa “passeio distraído”, foi um passeio distraído da estrela em ascensão marisa pelo anonimato. diz que a sony quis pegar carona no marketing natural de marisa, divulgando o mimo. diz que vange vetou. grande vange leonel (& grande cilmara bedaque).
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ih, falando em vange lembro seu lindo grupo de rock, nau. nau foi breve, mas bom à beça. lembrando, penso nos anos 80; pensando nos anos 80, caio sentado dentro do directv hall, num badalado evento “comemorativo” dos 80, com leo jaime, kid vinil (ex-verminose, ex-magazine, ex-heróis do brasil), leoni (ex-kid abelha, ex-heróis da resistência), roger (ex-ultraje a rigor), ritchie (ex-vímana) e evandro mesquita (ex-blitz) cantando só hits vintões… esquisito, misto de melancolia e alegria. inevitável pensar em certa atmosfera de decadência – que ninguém cai na rede do rock’n’roll sem saber que um dia se deparará com essa assustadora questão. mas bacana, também, encarar a permanência, esse bicho de sete cabeças que assusta tanta gente, principalmente quem pensa que pop tem prazo de validade, que pop vence nos 15 minutos regulamentares de fama preconizados por papa andy warhol – ai, essa referência já é clichê do clichê, né? fama de 15 minutos é tsunami.
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penso sobretudo no ritchie. ritchie é um grande cara, um grande cara. “vôo de coração” (epic/cbs, 1983) é um grande, grande, grande disco pop. emocionante acompanhar os gestos precisos/sofisticados de ritchie lá no palcão/balcão directv, sua musicalidade ainda um pouco mais afiada que 20 anos atrás. pois a platéia estranhou, congelou, parou de pular. mistério. a platéia parece exigir que ritchie ainda seja o mesmo e viva como nossos pais. platéia é fogo.
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porque, sim, a pulou a beça durante a refestança. quando roger cantou “nós vamos invadir a sua praia” e “inútil” (ambas do lp “nós vamos invadir a sua praia!”, ultraje a rigor, wea, 1985), a casa veio abaixo, para usar outro clichê do clichê, tipo “no olho do furacão”. fiquei pensando, fiquei, sim. “nós vamos invadir a sua praia!” é legal porque foi um dos únicos momentos da história do pop brasileiro em que os paulistas tentaram ocupar espaço com discurso construtivo, sem muro das lamentações (“separa um lugar nessa areia/ nós vamos chacoalhar sua aldeia”, paulistas provocavam cariocas). os paulistas queriam roubar a areia dos outros, ou só queriam um cantinho ao sol? com a palavra, paulistas & cariocas…
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já “inútil” é caso mais complicado. num brasil que não tinha eleição direta nem muita perspectiva de futuro, era feroz e ferino proclamar que “a gente não sabemos escolher presidente/ (…) a gente somos inútil”. era crítica ácida e mordaz, captou? aí me assusta um pouco ver em 2005 a plebe rude (eu inclusive) cantando em coro “a gente não sabemos escolher presidente”. porque, vá lá, a gente até podemos cantar isso pra gente nos divertirmos. mas, espera lá, de ultraje a rigor para cá a gente já aprendemos a eleger presidente! a gente aprendemos de montão com o fiasco collor (e com a mordacidade ácida do ultraje a rigor), e na minha modesta opinião tudo só tem melhorado desde o (não-eleito) itamar franco para cá, a ponto de os gringos já nem pensarem mais que a gente é indigente (humpf, não que isso seja termômetro de nada, ó, colonialistas)!
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mas, então, falando em “olho do furacão”… outro dia aqui no blog(ue) aprendemos com o paulo eduardo que o “olho do furacão” é, na verdade, surpresa!, um ponto de completa calmaria – o contrário do que se pensa quando se late, mia e pia “o olho do furacão”, au au au, cocoricó. me faz lembrar de outro clichê, “cortina de fumaça”: com o perdão dos clichês dos clichês, tô achando que olho de furacão é uma cortina de fumaça. e isso me faz lembrar, enfim, o escândalo destes 15 minutos de agora (alô, andy), de quando o falastrão lula deslizou possíveis maracutaias da época do papudo fhc. aí pronto, o escândalo de (ir)responsabilidade se localiza todinho debaixo do papo do sapo, da papada do lula (ave, papa joão paulo). mas, vem cá, não dá para abaixar a cortina da fumaça e sair do olho do furacão? porque eu quero saber se afinal os tucanos paparam minhas merrecas ou não!!!!
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e a enésima tentativa de evandro mesquita de ressuscitar a blitz? a blitz era uma grande banda, uma grande banda. o lp “as aventuras da blitz 1” (emi-odeon, 1982) mudou a minha vida, mudou a vida de um monte de gente. e era bom à beça, embora à época a gente não soubesse escolher presidente e tivesse um pouco de vergonha de sequer pensar que aquele descompromisso todo pudesse receber o rótulo de “bom”. mas é chato ver, hoje em dia, umas moças jovenzinhas de lindas pernocas ocupando o vácuo de márcia bulcão e fernanda abreu. meu, quem fazia os vocais da blitz era fernanda abreu!!, e isso é tão histórico quanto o fato de o lobão ter sido baterista da blitz!! respeito à fernanda abreu é bom e a gente gosta!!
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aliás, minha amiga marcia bechara se assustou com a ausência do lobão no festim. não se assuste, pessoa. seria o máximo, mas para participar de um projeto como aquele (gerenciado pelo espertíssimo alexandre ktenas, homem criado e nutrido dentro da grande indústria) o lobão teria que ser o antilobão, não o lobão. fico imaginando a xingança que seria sua presença naquele convescote cinzento – “o rock errou, seus teletubbies!” seria o xingo mínimo. alô, lobão!
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ah, tudo isso me lembra de “popsambalanço & outras levadas” (rca/bmg, 1989), do lulu santos. qualquer hora quero falar desse disco aqui…
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ah, e tem o leo jaime. tem gente que fica horrorizada, mas eu, pessoalmente, adoro a barriga proeminente do leo jaime. porque ele podia estar escondido em casa, acreditando que roqueiro barrigudo não pode, mas, que nada! quem foi que falou que não pode?! a voz de leo jaime está intacta, ele continua cantando (bem) como cantava nos coloridos anos 80. então sem essa de horror, hein? sem essa de ditadura estética, que isso é papo de casca. que me lembra, inevitavelmente e com muito prazer, de lady marianne faithfull. pois a ex-garota de mick jagger, a mais linda e loura dos anos 60, há poucos anos posou de biquíni na capa de uma revista européia, do alto de seus 60 anos, de suas rugas e de suas abundantes, lindas e expostas pelancas. genial, de chorar de comoção. aumenta que isso, sim, é que é rock’n’roll!
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sobre o retorno dos dinos, o ritchie diz “eu já sabia!” (estava escrito na sua camisa). fico dividido entre um sentimento de revival de revival da jovem guarda (esse também rola a cada data redonda, e os caras parecem prisioneiros desse eterno retorno) e um outro bem diverso, bem traduzido pelo leo jaime quando disse, no show de sábado, que segue sua carreira com dignidade e totalmente independente (in-de-pen-den-te) dos desvarios das grandes gravadoras. a permanência, afinal, é plástica ou pelancuda? ou é ambas, tudo ao mesmo tempo agora? vou pela terceira hipótese, acho.
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tem uma outra sensação que sempre me vem, e me vem da música da neusinha brizola (saudades de neusinha!, filha rebelde do leonel, se não me engano aquele que cunhou para lula o pixe “sapo barbudo”): “a cobertura era uma quitinete, a festa [de arromba] era mintchura”. os anos 80 me têm esse sabor. mas acho que mintchura era muito mais o festim diabólico das gravadoras que o talento & a gana daqueles artistas.
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aliás, eu dou gargalhada até hoje duma coisa que li neusinha brizola dizer no tempo em que os pterodáctilos ainda voavam. diz que perguntaram o que ela fazia quando sentia vontade de fazer ginástica. “sento e espero a vontade passar”, disse ela. alôôôôôô, marianne faithfull!!!!!!!!
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quitinete é legal, apesar de apertado. quitinete é o vira-lata dos apartamentos. como o vira-lata é o fusca dos cães. como o fusca é o pirulito dos carros. como o pirulito é o roberto carlos dos doces. como roberto carlos é a quitinete, o vira-lata, o fusca e o pirulito dos cantores. rendo vivas aos vira-latas (alô, galã). até porque sangue azul, neste mundo onde tudo se mistura, é tudo truque, puro perfume, mera mintchura.

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Editor de FAROFAFÁ, jornalista e crítico musical desde 1995, autor de "Tropicalismo - Decadência Bonita do Samba" (Boitempo, 2000) e "Como Dois e Dois São Cinco - Roberto Carlos (& Erasmo & Wanderléa)" (Boitempo, 2004)

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