O cooperativismo brasileiro cresce assentado em sete grupos de valores: adesão livre e voluntária, gestão democrática, participação econômica dos sócios, autonomia-independência, educação-formação-informação, intercooperação, preocupação com a comunidade. Atualmente, profissionais de 13 grandes ramos são aceitas como passíveis de se tornar cooperativados – agropecuária, consumo, educação, habitação, saúde, transporte, turismo, e assim por diante.

Há menos de uma década, músicos intensificaram a (auto)organização em cooperativas, em diversos estados do país. Mas essa categoria não se inclui entre os 13 ramos, nem outra mais ampla na qual a música estaria incorporada, a cultura. No processo de construção do I Seminário de Cooperativismo Musical, que aconteceu na semana passada em Rio Branco (AC), profissionais da cadeia produtiva musical definiram como uma de suas metas principais o reconhecimento da cultura no décimo-quarto ramo do cooperativismo. “Seria uma ação de reflexo mundial. Se a gente consegue regularizar isso aqui, a gente faz uma revolução mundial”, empolga-se o músico Tony Bandolim, presidente da Cooperativa da Música do Acre.

Fundada há menos de um ano, a cooperativa local já tem 580 filiados, num universo de 700 mil habitantes, o que dá um índice superior ao da mais antiga (e pioneira) Cooperativa da Música de São Paulo, segundo Tony. Violonista, guitarrista e bandolinista, ele é carioca radicado há 11 anos no Acre e trabalhou no setor de informática da Rede Globo por 14 anos.

Como prestador de serviços para a Globo, acudiu autores como Dias GomesFerreira Gullar e Sílvio de Abreu no início da utilização de computadores para entregar capítulos de novelas. Como instrumentista, tocou com Jamelão, Moreira da Silva,Monarco, Maurício CarrilhoLeci Brandão Dicró, entre outros. “Nunca tive a pretensão de ser um artista famoso. Quando comecei a tocar, meu grande objetivo era tocar com os grandes músicos, e toquei com um montão deles”, afirma, como a justificar o desprendimento que lhe permitiu trocar o Rio pela Amazônia.

De volta ao cooperativismo, ele mira o futuro: “Se fizermos uma coisa bem organizada, teremos uma rede de empresas que poderão distribuir tudo que se produzir em cultura, o tempo todo”. E cita o exemplo de um violonista de peso que se apresentou em Rio Branco durante o seminário: “O Marco Pereira escreve um livro, o editor fica com 90% da grana. Se fizer dentro deste processo, ele faz o livro dele, paga o custo da gráfica, a distribuição fica por conta das cooperativas. Elas ficam com 10% para fazer o trabalho circular, o resto é dele. Isso pode ser feito por todo mundo, acaba atravessador, o poder de negociação é outro”, prevê.

O cenário delineado por Tony pode parecer imaginação, mas, dado o grau crescente de mobilização (do qual o Acre é exemplar), não é difícil ver no horizonte um cenário em que as hoje agonizantes gravadoras multinacionais estejam substituídas por cooperativas formadas por núcleos locais, regionais, espalhados por todos os cantos do país. Não é difícil, tampouco, imaginar o Brasil como pioneiro num processo como esse – afinal, foi aqui que se (auto)inventaram as indústrias criativas artesanais do funk carioca, do tecnobrega, do novo forró nordestino etc.

Imaginemos, embalados pelo carioca que virou acreano, que a ideia vingue.

Se agricultores se unem em cooperativas com objetivos como os de produzir alimentos naturais, sem agrotóxicos, profissionais desse outro ramo poderiam produzir cultura, arte, música e jornalismo cultural orgânicos, livres de pesticidas e outros lixos tóxicos.
 

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5 COMENTÁRIOS

  1. Vale como poesia, ponto. Não fez uma aula de química, de herbicidologia, pragas, não sabe a diferença de produção entre um hectare orgânico e um com agroquímicos, não sabe o que é meia vida de um produto químico… Realmente gostaría que todos nós tivessemos vegetais sem adubo, sem nenhuma fórmula química, nenhum fungicida, mas quantos mundos e quantas amazônias a fronteira agrícola teria que devassar para produzir alimento para todo mundo. Não seria um cavaquinho sozinho.

  2. […] O filme que está em cartaz agora é manjado à beça. Os primeiros jornalistas (ou melhor, hoje em dia, blogueiros, twitteiros etc.) se encantaram. Os próximos se encaixaram no efeito-manada “ainda não ouvi, mas já sei que vou amar”. (Os indecisos ficaram meio na moita.) Filhotes dos hype-victims, surgiram ato contínuo os da manada oposta, antihype-victims, “ainda não ouvi, mas odeio desde criancinha”. Os “não ouvi, odiei, não vou ouvir” de plantão repetiram sua ladainha, o melhor objeto de rancor de todos os tempos da última semana. Hype bom é além-fronteira, hype daqui é lixo tóxico. […]

  3. Esse processo de democratização da produção musical é um movimento sensacional. Mas uma questão que deverá ser enfrentada em breve é a questão da hierarquização dentre desses coletivos conforme eles ganhem corpo.
    E pra evitar isso os coletivos terão que se posicionar ideológicamente,ou reproduziram o modelo contra o qual lutam.

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